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quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Cobertura de Show: The 69 Eyes – 31/08/2025 – Fabrique Club/SP

Gothic Rock finlandês, os Vampiros de Helsinki fazem bom show de redenção

O frio fim de inverno paulistano era o ambiente perfeito para um show “trevoso”! Foi nesse momento propício que, após pouco mais de um ano de se apresentarem no Summer Breeze Brasil 2024, o The 69 Eyes, uma das mais icônicas e cultuadas bandas de gothic rock, ou gothic metal, como preferirem, voltou a São Paulo para único show no Brasil. 

Expectativas existiam - e muitas. Na fila do evento, pessoas chegaram às sete horas da manhã para ficarem na “grade” (não havia grade, no fim das contas, o que é um problema, mas falaremos depois disso). Mais que isso, falamos com pessoas que vieram de Belém-PA, outros de Minas Gerais, só para assistirem o show. Não podemos deixar de citar isso, pois indica muito bem o quão apaixonados são os fãs da banda, e do gênero em geral. Além de tudo, o show do ano passado, no Summer Breeze Brasil, havia sido um tanto prejudicado por problemas técnicos persistentes, e um dos mais criticados do festival por esse motivo, então seus fiéis admiradores precisavam de uma redenção nesse específico quesito.

Com curto atraso - tolerável, dado o ótimo horário agendado -, quando as portas do Fabrique abriram, já havia uma boa fila na porta, embora nada que demonstrasse o quão cheio estaria. Acreditem, foi bem cheio (não lotado, mas cheio)! Poucos minutos após aberta a casa, o com capacidade ainda pela metade, a banda Drama subiu ao palco para a abertura do evento. Um grupo de faz uma interessante mistura de pós-punk com alguns elementos eletrônicos, como um New Order encontrando o Depeche Mode, foram muito aplaudidos em sua ótima apresentação. Não para menos, é exatamente o que se espera de um evento com a maior parte dos presentes pertencentes à sub-cultura gótica, e suas músicas “de Madame” (em referência à tradicional balada gótica paulistana, Madame, antigo Madame Satã) fazem parte da vida cotidiana desse povo. Começamos bem a noite, que ainda melhoraria!

Um dos pontos mais altos da noite, e uma grata surpresa, foi a banda When I Die. Mais pesados que a anterior, já se aproximando mais do “metal”, têm uma formação curiosa: eles não têm baterista! Isso não só não prejudica, como deixa seu som único. As baterias eletrônicas dão uma estética dançante ao som, e a densidade das vozes - tanto masculina quanto feminina - criam um ambiente soturno. Destaco o magnífico cover de Hells Bells do AC/DC, que embora seja um verdadeiro hard rock, em sua roupagem original, nessa releitura absurdamente criativa se encaixou no ambiente e até parecia que foi composta para ser assim - claro, sem desmerecer a original dos australianos, que é um clássico absoluto. Quando colocam duas bandas de abertura em um evento, ficamos muitas com pé atrás, pois chega a ser cansativo. Mas ali, não foi o caso. O When I Die merece um posto de destaque na cena gótica brasileira. Eu não criticaria uma pessoa que me falasse que foram os melhores do evento, embora não os principais.



Chegava o momento, então, dos donos da festa. Os Vampiros de Helsinki, em sua quarta passagem pelo país. Anteriormente, haviam fechado uma das noites do Summer Breeze Brasil 2024; em 2010, seu único show solo por aqui, e vinte anos atrás, uma apresentação diurna no Live N Louder.

No ano passado, apesar das expectativas - já que tinham cancelado apresentações no país anos antes -, o show foi cheio de problemas técnicos, e até mesmo o setlist teve que ser reduzido, com intervalos longos entre músicas que só pioraram pela presença de Supla tendo que improvisar coisas a falar no palco. Merecíamos mais, com todo respeito ao Papito, que fez o que podia. Essa era a oportunidade, e para casa cheia, ainda por cima!

Subiram ao palco com um tempo considerável de intervalo, mas dentro dos conformes, por se tratar da atração principal. Começaram bem, já com clássicos - no caso, Devils, e depois Feel Berlin, outra das antigas. É até engraçado ouvir a voz cantada do vocalista Jyrki 69, bem grave, mas quando fala, tem uma voz bem diferente, que nada lembra toda aquela profundidade. Isso não é uma crítica, e sim um elogio a alguém que tem ótima técnica e controle vocal. Em presença de palco, contudo, quem rouba a cena é o baterista Jussi 69 - animado, enérgico, toca jogando os braços para cima, e marretando a caixa de seu instrumento. Uma crítica, porém, é quanto ao som: não, não tivemos os problemas infindáveis da apresentação do Summer Breeze, mas pouco se ouvia do baixo, e da própria bateria, a caixa era muito mais alta que o resto das peças, e até encobria muitas partes do instrumental.

Em se tratando do setlist, foi o famoso “jogar seguro”. Não diferiram do que vinham fazendo recentemente, que na verdade é até interessante, com músicas que não tinham sido tocadas no Brasil, e que começaram a tocar ao vivo faz pouco tempo. Apesar disso, apenas uma do último, e excelente, disco mais recente, Death of Darkness - a ótima Drive -, o que é uma pena. Também apostaram muito em sua carreira de meados dos anos 2000, que não é exatamente a mais querida entre os fãs, com um punhado de clássicas, mas sem canções bem melhores mais antigas. Claro, algumas excelentes, como Gothic Girl, Brandon Lee e o bom cover do Boycott, Gotta Rock não podiam faltar, e não faltaram.


Já no bis, aquela “surpresa que todos sabiam”, e logo de cara, um cover dos Ramones, I Just Want to Have Something to Do, com Supla em dueto no vocal - Supla que, em 2024, quando estiveram aqui para o festival, foi o “mestre de cerimônia” do show dos finlandeses, então era quase óbvia uma participação do brasileiro. E não ficou ruim, pelo contrário, só não é algo inesperado. Fecharam a noite como todos esperavam, e não podia ser diferente: Lost Boys, seu maior hit, uma ode aos anos oitenta, e ao filme de vampiros de mesmo nome, estrelando Kiefer Sutherland (hoje em dia mais conhecido pelo personagem Jack Bauer, da série 24 Horas). 

No geral, uma noite de redenção, após o complicado show anterior, que foi bem sucedida. Não uma apresentação fora de série, nem impecável, mas com um setlist completo, sem qualquer “B.O.”, e uma performance tecnicamente excelente de cada um dos músicos. O famoso “play safe” funcionou muito bem, e os horários amistosos a todos deixou tudo melhor.




Edição/Revisão: Gabriel Arruda 





The 69 Eyes – setlist:

Devils

Feel Berlin

Perfect Skin

Betty Blue

Gotta Rock (Boycott cover)

Still Waters Runs Deep

Drive

Hevioso

The Chair

Cheyenna

Never Say Die

Gothic Girl

Wasting the Dawn

I Love the Darkness in You

Brandon Lee

I Just Want to Have Something to Do (Ramones cover)

Bis

Dance d’Amour

Lost Boys

Cobertura de Show: Wacken Open Air – 31/07/2025 – Schleswig-Holten/GE

Sob Céus Tranquilos, Sons Pesados: O 31 de Julho no Wacken Open Air


Metal Yoga: Atrações Fora dos Palcos

Antes mesmo das primeiras guitarras soarem, o dia no Wacken já começa com energia. Às 11h da manhã, a personal trainer Sophie Watcher lidera uma sessão de exercícios aeróbicos em grupo. Essa atividade se tornou uma tradição curiosa e divertida do festival: dezenas de headbangers se reúnem para alongar, pular e aquecer o corpo, preparando-se para as longas horas de música intensa que seguem.

A cena é quase surreal — jaquetas de couro, camisetas pretas e botas pesadas dividem espaço com movimentos de ginástica coletiva — mas traduz bem o espírito do evento: união, resistência e celebração.

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Metal Battle – Descobertas do Underground (Headbangers Stage)

Um dos momentos mais marcantes do dia veio do Metal Battle, no Headbangers Stage, vitrine essencial para revelar novos talentos do metal mundial. Entre as apresentações, uma grata surpresa foi a banda chinesa de power metal Eternal Power.

Com irreverência, energia contagiante e execução precisa, o grupo transformou seus 20 minutos de palco em uma celebração épica. Faixas como “Chasing Your Dream” e “Salvation” evidenciaram o potencial da cena metálica chinesa, mostrando que o país tem, agora, um representante de peso no heavy metal global.

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Skyline (Harder Stage) – A Tradição da Abertura

Já conhecida do público, a banda Skyline cumpriu mais uma vez seu papel de dar as boas-vindas oficiais ao festival. Com um repertório recheado de covers icônicos, o grupo levou o público a viajar por diferentes eras do rock e do metal.

Músicas como “Stricken” (Disturbed), “Fool for Your Loving” (Whitesnake), “You’ve Got Another Thing Coming” (Judas Priest) e “In the End” (Linkin Park) fizeram o público cantar em uníssono, provando a diversidade de gerações presentes no Wacken. O ponto alto, como sempre, foi a execução da clássica “This Is W.O.A.”, verdadeiro hino do festival.

Wacken Press

Wacken Press

Wacken Press

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Grave Digger – 45 Anos de História no Palco do Wacken (Harder Stage)

Se havia um show que já carregava o peso da história antes mesmo das primeiras notas, esse era o do Grave Digger. Celebrando 45 anos de estrada, a banda mostrou por que é considerada um dos pilares do heavy metal europeu.

Sob o comando do carismático Chris Boltendahl, eterno frontman, a apresentação foi uma verdadeira viagem pela carreira da banda. O setlist incluiu clássicos como “Rebellion (The Clans Are Marching)”, “Valhalla”, “Dark of the Sun” e encerrou de forma apoteótica com “Heavy Metal Breakdown”. A participação de Uwe Lulis, retornando após 25 anos, e de Jamiro Boltendahl, filho do vocalista, tornou o momento ainda mais memorável.

Nayara Sabino

Nayara Sabino

Nayara Sabino

Nayara Sabino
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Clawfinger – Lendas do Rap-Metal (Louder Stage)

Nascida na Suécia no início dos anos 1990, Clawfinger é pioneira do rap-metal europeu, conhecida pela mistura agressiva de guitarras pesadas com vocal rap feroz e letras politizadas. O show foi pura energia, com clássicos como “Nothing Going On” e “Recipe for Hate”, mantendo a plateia completamente envolvida do início ao fim.

Wacken Press

Wacken Press

Wacken Press

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Ministry – Industrial Implacável (Louder Stage)

Formada em Chicago em 1981 por Al Jourgensen, Ministry é uma das bandas pioneiras do industrial metal. Evoluindo do synth-pop para sonoridades pesadas e sampleadas, a banda apresentou faixas históricas como “Hail to His Majesty (Peasants)”, “N.W.O.”, “Psalm 69” e “Just One Fix”.

O que se viu foi uma parede sonora industrial e implacável, com batidas eletrônicas e guitarras afiadas que hipnotizaram os fãs e geraram headbanging em estado puro.

Wacken Press

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Wacken Press

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Krisiun – Brutalidade e Técnica Extrema (W.E.T Stage)

Krisiun, trindade do death metal brasileiro formada em 1990, apresentou um show especial tocando apenas músicas de seus três primeiros álbuns: “Black Force Domain” (1995), “Apocalyptic Revelation” (1998) e “Conquerors of Armageddon” (2000).

A intensidade foi sufocante: riffs velocíssimos, solos devastadores e drumsolo apoteótico de Max Kolesne levaram os fãs ao limite, consolidando um clima de respeito absoluto e visceral.

Wacken Press

Wacken Press

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Guns N’ Roses – Estreantes Lendários (Harder Stage)

O clímax do dia estava reservado para Guns N’ Roses, que subiu ao palco principal às 20h35 para uma performance histórica de mais de 3 horas — o show mais longo já registrado no Wacken.

O setlist atravessou todas as fases da banda: “Welcome to the Jungle”, “Mr. Brownstone”, “You Could Be Mine”, “Estranged”, baladas como “November Rain” e “Patience”, e a explosão final com “Nightrain” e “Paradise City”.

Houve ainda homenagens especiais: “Sabbath Bloody Sabbath”, “Never Say Die” (Black Sabbath), “Thunder and Lightning” (Thin Lizzy) e “Human Being” (New York Dolls), tornando a apresentação inesquecível.

Wacken Press

Wacken Press

Wacken Press

Wacken Press

Wacken Press

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Natureza Selvagem – Um Desfecho Único

E, como se não bastasse a intensidade musical, a natureza decidiu marcar presença: após o encerramento do show, uma tempestade com relâmpagos impressionantes caiu sobre o festival, obrigando evacuação parcial dos acampamentos por motivos de segurança.

Um desfecho dramático e épico, digno da grandiosidade vivida nos palcos — algo que só poderia acontecer em um festival de heavy metal como o Wacken.



Fotos: Wacken Press / Nayara Sabino (Grave Digger)

Edição/Revisão: Gabriel Arruda 


Skyline – setlist:

Hold On

Running Back to You

Under the Radar

Stricken (Disturbed cover)

Dream Engine

Fool for Your Loving (Whitesnake cover)

You've Got Another Thing Comin' (Judas Priest cover)

Human Monster

In the End (Linkin Park cover)

Fireball
 
This Is W:O:A


Grave Digger – setlist:

Twilight of the Gods

The Grave Dancer

Kingdom of Skulls

Under My Flag

Valhalla

The Curse of Jacques

The Dark of the Sun

The Devils Serenade

Back to the Roots

Excalibur (participação especial de Uwe Lulis)

Rebellion (The Clans Are Marching) (participação especial de Uwe Lulis e Jamiro Boltendahl)

Heavy Metal Breakdown


Clawfinger - setlist:

Burn in Hell

Nothing Going On

Scum

Rosegrove

Warfair

Catch Me

Undone

Out to Get Me

Ball & Chain

Two Sides

Recipe for Hate

Hold Your Head Up

The Price We Pay

Biggest & the Best

The Truth

Do What I Say


Ministry - setlist:

Thieves

The Missing

Deity

Rio Grande Blood

LiesLiesLies

Goddamn White Trash

Alert Level

Burning Inside

Stigmata

N.W.O.

Just One Fix

Jesus Built My Hotrod

So What


Krisiun - setlist: 

Kings of Killing

Ravager

Endless Madness Descends

Scourge of the Enthroned

Hatred Inherit

Messiah's Abomination

Blood of Lions

Conquerors of Armageddon

Descending Abomination


Guns N' Roses – setlist:

Welcome to the Jungle

Bad Obsession

Mr. Brownstone

Chinese Democracy

Live and Let Die

Yesterdays

It's So Easy

Civil War

Used to Love Her

Slither (Velvet Revolver cover)

Never Say Die (Black Sabbath cover)

Sabbath Bloody Sabbath (Black Sabbath cover)

Shadow of Your Love

You Could Be Mine

Estranged

Double Talkin' Jive

Hard Skool

The General

Thunder and Lightning (Thin Lizzy cover) 

Coma

Absurd

Rocket Queen

Knockin' on Heaven's Door

Sweet Child o' Mine

November Rain

Sorry

Patience

Human Being (New York Dolls cover)

Nightrain

Paradise City

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

Entrevista: A Psicose Primata com Altas Doses de Peso da Psychotic Apes

 


Diretamente de Salvador, Bahia, a Psychotic Apes vem conquistando espaço no cenário do metal nacional com uma sonoridade que passeia entre o doom, sludge e metal alternativo, carregada de peso, experimentação e atmosferas intensas. 

Formada com a proposta de unir agressividade e emoção, a banda tem se destacado pela autenticidade de suas composições e pela energia de suas apresentações, trazendo letras que abordam reflexões existenciais, críticas sociais e sentimentos sombrios. 

Com essa identidade única, os baianos consolidam-se como um dos nomes mais promissores da cena pesada, abrindo caminho para novos voos dentro e fora do underground. Confira o papo com a banda, que falou mais a respeito do seu mais recente trabalho.


- Olá Ramiro. Obrigado pela sua gentileza em nos atender. Parabéns pelo lançamento do álbum “Marakatus”, pois o material ficou de primeira...

R – Nós é que agradecemos, é um prazer falar com vocês.


- Como você pode descrever o trabalho na composição deste tipo de sonoridade?

R - Esse álbum levou mais tempo que os anteriores para ficar pronto. No processo, tivemos uma maior participação dos membros da banda, todos contribuíram com ideias para a estrutura das músicas etc. 

Em geral, eu componho uma base harmônica, junto com as melodias, as letras e um esqueleto inicial. Daí, levamos ao estúdio nos ensaios, para ver o que está funcionando e o que precisa melhorar. Nessas sessões, com toda a banda reunida, as versões finais dos arranjos são definidas.

- Creio que é preciso algumas audições para captar por completo a proposta da banda, você sente que o público às vezes tem uma dificuldade inicial ?

R – Essa dificuldade é explicável ante a profusão de influências que existe no nosso som. Temos uma base de metal/hard rock e sobre ela muitas camadas que vão desde rock alternativo até música regional brasileira. É preciso mesmo algumas audições para digerir tudo.


- Existem planos para o lançamento de “Marakatus” no exterior no formato físico? Tivemos contato até agora, apenas o formato físico nacional...

R – Nosso selo, a MS Metal Records, está em contato com parceiros no exterior. Parece que há interesse sim, vamos aguardar.


- Como estão rolando os shows em suporte ao disco? A aceitação está sendo positiva?

R – A aceitação do disco tem sido excelente. Antes mesmo do lançamento, a gente incluiu algumas das novas faixas nos shows, para testar como elas funcionariam ao vivo, e a reação do público foi insana, sobretudo em músicas mais enérgicas como Boomers e The Road.


- Quem assinou a capa do CD? Qual a intenção dela e como ela se conecta com o título?

R – Além de músico, também faço ilustrações. Gosto de complementar a música com as artes visuais, integradas numa mesma obra. Assim eu fiz em todos os álbum da Psychotic.

A capa é uma referência direta ao título do álbum e apresenta o gorila, nosso mascote, tocando uma alfaia  (instrumento típico do maracatu) num manguezal.

- “Marakatus” foi todo produzido pela banda, confere? Conte-nos mais a respeito.

R – Sim, assim como os dois álbuns anteriores, “Marakatus” também foi produzido pela banda, mas dessa vez tivemos Paulo Medeiros como co-produtor, além de ter sido o técnico de gravação da bateria e ter assinado a mixagem e masterização do álbum. Ficamos extremamente satisfeitos com o resultado.


- Imagino que já estejam trabalhando em novas composições. Se sim, o que pode nos adiantar?

R – No momento, o foco total da banda está em promover o novo material e fazer o maior número de shows possíveis. Claro que, aqui e ali, uma ideia surge, um riff, uma melodia etc. Daí a gente registra, pra desenvolver depois.


- Novamente parabéns pelo trabalho, fica o espaço para sua mensagem final.

R – Obrigado pela oportunidade e um abraço a todos da Road to Metal!


Confira o Instagram da Banda 




Entrevista: A Força do Rock feito na Bahia pela Organoclorados

 


Formada na Bahia no início dos anos 2000, a Organoclaros construiu uma trajetória marcada pela experimentação sonora e pela força poética de suas composições. Unindo referências do rock alternativo e psicodélico à riqueza da música regional brasileira, a banda se destacou no cenário independente por criar uma identidade própria, intensa e crítica. 

Suas letras, carregadas de simbolismo, dialogam com questões existenciais, sociais e ambientais, enquanto os arranjos mergulham em atmosferas densas e climáticas. 

Ao longo dos anos, a Organoclaros participou de festivais, coletâneas e projetos culturais, firmando-se como um dos nomes que melhor representam a vertente underground e inovadora da música baiana, para além dos estereótipos. Conversamos com André G. , que nos falou mais a respeito do mais recente trabalho e novidades que estão por vir.


Olá, André G. Obrigado pela sua gentileza em nos atender. Parabéns pelo lançamento do álbum “Dreams and Falls”, pois o material ficou de primeira...

Eu que agradeço a oportunidade de conversar com vocês sobre esse lançamento da Organoclorados. Gratificante saber que gostaram do material.


- Como você pode descrever o trabalho na composição deste tipo de sonoridade?

Acho que a sonoridade alcançada nesse álbum evoluiu desde as primeiras gravações de estúdio e as produções que realizamos. “Dreams and Falls” tem sua própria identidade, mas tem uma conexão com os álbuns anteriores, a começar pelo álbum de estreia lançado em 2001, intitulado “Princípio Ativo” (que inclusive já tinha uma música em inglês), passando por “Quântico” (2018), “Efeito Residual” (2020) e “Saudade da Razão” (2022). Durante a seleção das músicas que a gente tem guardadas para as gravações do “Saudade da Razão”, nos ensaios preparatórios, testamos algumas cantando em inglês, sem muito planejamento, só por curtição mesmo. 

Em 2023, retornamos ao estúdio para gravar músicas para um novo álbum em português e no meio do processo Artur apresentou Just for Today à banda e as conversas internas avançaram porque a gente viu a chance de gravar em inglês, aproveitando músicas do “Saudade da Razão” que tinham potencial de se adaptar bem ao inglês, junto com outras inéditas que estavam na fila para gravar. Vieram as sessões de estúdio, Artur e Joir gravaram as guias de guitarra, voz e bateria, e definiram andamentos e estruturas. 

Logo depois, eu inseri as linhas de baixo, escolhendo os instrumentos diferentes conforme a proposta da música. Artur fez o mesmo nas guitarras, nos licks, arpejos, solos e timbres, às vezes até utilizando mais de uma guitarra na mesma música. Em paralelo, as bases de teclados e piano, para seleção posterior de timbres. O mais legal nessas etapas do processo é que os integrantes contribuíram com opiniões em relação aos demais. Por último, Artur colocou as vozes definitivas e Roger gravou os backing-vocals. Na reta final, acompanhamos de perto o processo de mixagem e edição, principalmente Artur e Joir que estiveram em quase todas as sessões. 

Uma ideia que Artur teve durante conversas com Lucas Costa, técnico de gravação do estúdio Jimbo, e que se mostrou muito interessante foi a de aplicar uma masterização nas músicas em inglês, diferenciada daquela aplicada às faixas em português que ainda inéditas e também das versões originais que estão no Saudade da Razão. O direcionamento sempre foi para tentar ao máximo traduzir os ciclos de alternância entre peso e melodia, sonho e colapso, realização e decepção, como bem explica o texto de apresentação do álbum. Acho fomos ao extremo da nossa capacidade de mesclar melancolia e energia dançante, explorando sonoridades vintage e texturas contemporâneas.

- Os fãs e mídia em geral tem entendido a proposta do álbum da maneira que vocês esperavam, ou você vê alguma alguma dificuldade na assimilação ?

Não vejo exatamente como uma dificuldade. Acho que requer uma certa atenção, mais quanto mais se escuta, experimenta e conhece, mais fácil e natural vem o entendimento da proposta e principalmente das mensagens que estão nas letras. Tem gente que primeiro tenta entender, tem gente que curte e dança pra depois analisar, e tem gente que só relaxa, deixa fluir e apenas sente. Nossa música é persistente, tem efeito residual e acumulativo nos corações e mentes de quem ouve e processa. 

No caso do álbum novo, fora uma barreira natural para quem não domina o inglês, que é relativamente fácil de transpor com um tradutor digital, o mais atrativo para mim é a curiosidade que ele desperta. Temos consciência que a identidade artística que desenvolvemos desde o início pode provocar estranhamento, curiosidade, questionamentos, reflexão... Tanto no Brasil quanto no exterior, os fãs retornam das mais variadas formas, demonstrando essa interação, seja com as letras, seja com as harmonias e melodias.


- Existem planos para o lançamento de “Dreams and Falls” através da MS Metal Records, atual gravadora de vocês, no formato físico? Tivemos acesso apenas ao formato digital por enquanto.

Gostamos bastante de lançar material físico, mas devido à tecnologia digital que vem tornando a distribuição por streaming predominante no mercado musical, ultimamente a dúvida em relação a esse tipo de investimento adicional é recorrente no segmento independente. 

Mas chegou essa proposta de parceria da MS Metal Records para viabilizar a versão física de Dreams and Falls. De início, será uma tiragem modesta, voltada a ações promocionais e um pequeno teste de mercado já está em etapa bem avançada de formatação e produção e em breve teremos mais detalhes.


- E como está a divulgação e aceitação fora do país?

Em “Dreams and Falls”, as canções originalmente escritas em inglês e as versões cuidadosamente elaboradas materializaram um conceito que reforça a identidade artística e musical da banda. Ao mesmo tempo, serviu como um teste pessoal e um marco em nossa carreira. 

Pelo que sei, estamos muito satisfeitos. Por fim, como há o propósito de projetar ainda mais a música que criamos para ouvintes de outros países, este novo trabalho também é uma experiência de posicionamento e projeção com a qual vamos aprender bastante. 

Concretizar esse projeto foi um desafio e um grande aprendizado, em muitos sentidos. 


- Como estão rolando os shows em suporte ao disco? A aceitação está sendo positiva?

Os períodos de lançamento de álbuns costumam não interferir em nosso ritmo de shows. Fazemos shows conforme as oportunidades aparecem, mas é claro que nesse período incluímos estratégias para promover nossas novidades, como a inclusão das músicas do álbum no repertório e alguns shows especiais para essa promoção. 

A receptividade nos shows condiz com o que vemos nas mídias sociais e imprensa, seja nas reações espontâneas, seja nos comentários que ouvimos do público. O que vimos nos shows realizados entre março e agosto deste ano foi um público bem caloroso, interativo e carregado de boas vibrações. 

Claro que as versões de músicas já conhecidas são mais fáceis de absorver e isso ajuda bastante na assimilação, porém ainda estamos no início da promoção das músicas do álbum e a realização de shows é uma ferramenta que movimenta. 

Porém, destaco que não temos condições de bancar por conta própria o investimento em uma grande turnê, apesar da vontade ser grande e estarmos abertos a propostas.


- Quem assinou a capa do CD? Qual a intenção dela e como ela se conecta com o título?

Bom, na verdade ninguém assinou oficialmente porque não teve um profissional específico, foi tudo por conta própria. Começou com a redução do custo de produção, vários esboços que Artur fez e nos mostrava, ouvindo as opiniões de todos, e foi avançando. A arte da capa tinha de representar o conceito embutido nas músicas e que vínhamos conversando para amadurecer. 

Um dia, Artur nos mostrou essa fotografia que depois descobrimos ser do Panteón, um monumento localizado no Cemitério de Montjuïc, Barcelona, de autoria de August Urrutia i Roldán, que destaca a escultura de um anjo abatido, está creditada a Josep Campeny i Santamaria. De cara a banda aprovou fez algumas sugestões para uma edição que adaptou a estética. Sem muita firula ou sofisticação, a capa enfim ficou pronta. E muito linda. Mas creio que o ponto forte está no significado que é até relativamente direto, mas conserva um toque de mistério. 

A imagem da capa retrata um momento de queda e abatimento, tanto físico quanto emocional. Pode ser dor ou sofrimento, mas o anjo está com as asas inteiras e acho que depende dele querer se reerguer e voar novamente. Não sei qual a intenção original ou qual mensagem do autor da escultura, mas acho que Artur tem razão ao analisar nossas reações e dizer que o valor artístico daquela obra se manifestou justamente quando inspirou nossa interpretação para gerar outra peça artística, nesse caso, a arte da capa do álbum. 

Na sequência, veio o resultado que convida e provoca o público para refletir, lembrar de seus próprios sonhos, colapsos e recuperações.

- “Dreams and Falls” foi todo produzido pela banda. Foi satisfatório seguirem por este caminho?

Sim, tudo por nossa conta e muito satisfatório, um processo de riquíssimo e intenso, em que tivemos um enorme aprendizado. Temos muita expectativa e curiosidade para conhecer como seria a reação dos ouvintes. 

Sabemos das limitações de uma banda sem recursos financeiros para ações de promocionais muito ambiciosas, mas creio que mesmo assim estamos positivamente surpresos com os comentários, matérias positivas publicadas no Brasil e no exterior (Estados Unidos, Inglaterra, México, Argentina, Chile, entre outros), músicas em playlists (algumas delas internacionais), veiculação em rádios e webradios, além de algumas entrevistas. 

Ele foi lançado nas plataformas digitais em março/2025. Como temos convicção a qualidade da produção e da seriedade do nosso esforço, seguimos firmes na divulgação.


- E vocês já estão trabalhando em novas composições? Se sim, como está se dando o processo e como ele está soando?

Sempre! A banda não para e temos muitas músicas compostas, várias prontas e guardadas para o futuro. De imediato, temos material gravado para mais duas produções inéditas: 01 álbum em português e 01 EP em espanhol. Estão na fase final de masterização, ambas ainda sem cronogramas de lançamento definidos. As músicas foram selecionadas depois de um conceito bem estabelecido e o processo de gravação trouxe novidades bem interessantes. 

As versões para o espanhol visam demonstrar nossa gratidão ao público da América Latina e da Espanha que tem sido muito carinhoso e bem receptivo em relação ao nosso som. O processo está acontece de maneira semelhante aos dois álbuns anteriores, mas incorpora novos aprendizados e técnicas. 

Em termos de sonoridade, queremos manter nossa identidade, mesmo com as novidades e a evolução constante. Ah, e as facetas continuarão a se revelar (algumas inesperadas), o que também é uma marca da banda.


- Novamente parabéns pelo trabalho e vida longa ao ORGANOCLORADOS...

Foi massa! Muito obrigado pela atenção e o espaço que nos deu aqui nessa entrevista, além desse retorno positivo em relação a nosso trabalho. Em nome da Organoclorados, um abraço e boas energias direto da Bahia.