quarta-feira, 3 de setembro de 2025

Entrevista: A Psicose Primata com Altas Doses de Peso da Psychotic Apes

 


Diretamente de Salvador, Bahia, a Psychotic Apes vem conquistando espaço no cenário do metal nacional com uma sonoridade que passeia entre o doom, sludge e metal alternativo, carregada de peso, experimentação e atmosferas intensas. 

Formada com a proposta de unir agressividade e emoção, a banda tem se destacado pela autenticidade de suas composições e pela energia de suas apresentações, trazendo letras que abordam reflexões existenciais, críticas sociais e sentimentos sombrios. 

Com essa identidade única, os baianos consolidam-se como um dos nomes mais promissores da cena pesada, abrindo caminho para novos voos dentro e fora do underground. Confira o papo com a banda, que falou mais a respeito do seu mais recente trabalho.


- Olá Ramiro. Obrigado pela sua gentileza em nos atender. Parabéns pelo lançamento do álbum “Marakatus”, pois o material ficou de primeira...

R – Nós é que agradecemos, é um prazer falar com vocês.


- Como você pode descrever o trabalho na composição deste tipo de sonoridade?

R - Esse álbum levou mais tempo que os anteriores para ficar pronto. No processo, tivemos uma maior participação dos membros da banda, todos contribuíram com ideias para a estrutura das músicas etc. 

Em geral, eu componho uma base harmônica, junto com as melodias, as letras e um esqueleto inicial. Daí, levamos ao estúdio nos ensaios, para ver o que está funcionando e o que precisa melhorar. Nessas sessões, com toda a banda reunida, as versões finais dos arranjos são definidas.

- Creio que é preciso algumas audições para captar por completo a proposta da banda, você sente que o público às vezes tem uma dificuldade inicial ?

R – Essa dificuldade é explicável ante a profusão de influências que existe no nosso som. Temos uma base de metal/hard rock e sobre ela muitas camadas que vão desde rock alternativo até música regional brasileira. É preciso mesmo algumas audições para digerir tudo.


- Existem planos para o lançamento de “Marakatus” no exterior no formato físico? Tivemos contato até agora, apenas o formato físico nacional...

R – Nosso selo, a MS Metal Records, está em contato com parceiros no exterior. Parece que há interesse sim, vamos aguardar.


- Como estão rolando os shows em suporte ao disco? A aceitação está sendo positiva?

R – A aceitação do disco tem sido excelente. Antes mesmo do lançamento, a gente incluiu algumas das novas faixas nos shows, para testar como elas funcionariam ao vivo, e a reação do público foi insana, sobretudo em músicas mais enérgicas como Boomers e The Road.


- Quem assinou a capa do CD? Qual a intenção dela e como ela se conecta com o título?

R – Além de músico, também faço ilustrações. Gosto de complementar a música com as artes visuais, integradas numa mesma obra. Assim eu fiz em todos os álbum da Psychotic.

A capa é uma referência direta ao título do álbum e apresenta o gorila, nosso mascote, tocando uma alfaia  (instrumento típico do maracatu) num manguezal.

- “Marakatus” foi todo produzido pela banda, confere? Conte-nos mais a respeito.

R – Sim, assim como os dois álbuns anteriores, “Marakatus” também foi produzido pela banda, mas dessa vez tivemos Paulo Medeiros como co-produtor, além de ter sido o técnico de gravação da bateria e ter assinado a mixagem e masterização do álbum. Ficamos extremamente satisfeitos com o resultado.


- Imagino que já estejam trabalhando em novas composições. Se sim, o que pode nos adiantar?

R – No momento, o foco total da banda está em promover o novo material e fazer o maior número de shows possíveis. Claro que, aqui e ali, uma ideia surge, um riff, uma melodia etc. Daí a gente registra, pra desenvolver depois.


- Novamente parabéns pelo trabalho, fica o espaço para sua mensagem final.

R – Obrigado pela oportunidade e um abraço a todos da Road to Metal!


Confira o Instagram da Banda 




Entrevista: A Força do Rock feito na Bahia pela Organoclorados

 


Formada na Bahia no início dos anos 2000, a Organoclaros construiu uma trajetória marcada pela experimentação sonora e pela força poética de suas composições. Unindo referências do rock alternativo e psicodélico à riqueza da música regional brasileira, a banda se destacou no cenário independente por criar uma identidade própria, intensa e crítica. 

Suas letras, carregadas de simbolismo, dialogam com questões existenciais, sociais e ambientais, enquanto os arranjos mergulham em atmosferas densas e climáticas. 

Ao longo dos anos, a Organoclaros participou de festivais, coletâneas e projetos culturais, firmando-se como um dos nomes que melhor representam a vertente underground e inovadora da música baiana, para além dos estereótipos. Conversamos com André G. , que nos falou mais a respeito do mais recente trabalho e novidades que estão por vir.


Olá, André G. Obrigado pela sua gentileza em nos atender. Parabéns pelo lançamento do álbum “Dreams and Falls”, pois o material ficou de primeira...

Eu que agradeço a oportunidade de conversar com vocês sobre esse lançamento da Organoclorados. Gratificante saber que gostaram do material.


- Como você pode descrever o trabalho na composição deste tipo de sonoridade?

Acho que a sonoridade alcançada nesse álbum evoluiu desde as primeiras gravações de estúdio e as produções que realizamos. “Dreams and Falls” tem sua própria identidade, mas tem uma conexão com os álbuns anteriores, a começar pelo álbum de estreia lançado em 2001, intitulado “Princípio Ativo” (que inclusive já tinha uma música em inglês), passando por “Quântico” (2018), “Efeito Residual” (2020) e “Saudade da Razão” (2022). Durante a seleção das músicas que a gente tem guardadas para as gravações do “Saudade da Razão”, nos ensaios preparatórios, testamos algumas cantando em inglês, sem muito planejamento, só por curtição mesmo. 

Em 2023, retornamos ao estúdio para gravar músicas para um novo álbum em português e no meio do processo Artur apresentou Just for Today à banda e as conversas internas avançaram porque a gente viu a chance de gravar em inglês, aproveitando músicas do “Saudade da Razão” que tinham potencial de se adaptar bem ao inglês, junto com outras inéditas que estavam na fila para gravar. Vieram as sessões de estúdio, Artur e Joir gravaram as guias de guitarra, voz e bateria, e definiram andamentos e estruturas. 

Logo depois, eu inseri as linhas de baixo, escolhendo os instrumentos diferentes conforme a proposta da música. Artur fez o mesmo nas guitarras, nos licks, arpejos, solos e timbres, às vezes até utilizando mais de uma guitarra na mesma música. Em paralelo, as bases de teclados e piano, para seleção posterior de timbres. O mais legal nessas etapas do processo é que os integrantes contribuíram com opiniões em relação aos demais. Por último, Artur colocou as vozes definitivas e Roger gravou os backing-vocals. Na reta final, acompanhamos de perto o processo de mixagem e edição, principalmente Artur e Joir que estiveram em quase todas as sessões. 

Uma ideia que Artur teve durante conversas com Lucas Costa, técnico de gravação do estúdio Jimbo, e que se mostrou muito interessante foi a de aplicar uma masterização nas músicas em inglês, diferenciada daquela aplicada às faixas em português que ainda inéditas e também das versões originais que estão no Saudade da Razão. O direcionamento sempre foi para tentar ao máximo traduzir os ciclos de alternância entre peso e melodia, sonho e colapso, realização e decepção, como bem explica o texto de apresentação do álbum. Acho fomos ao extremo da nossa capacidade de mesclar melancolia e energia dançante, explorando sonoridades vintage e texturas contemporâneas.

- Os fãs e mídia em geral tem entendido a proposta do álbum da maneira que vocês esperavam, ou você vê alguma alguma dificuldade na assimilação ?

Não vejo exatamente como uma dificuldade. Acho que requer uma certa atenção, mais quanto mais se escuta, experimenta e conhece, mais fácil e natural vem o entendimento da proposta e principalmente das mensagens que estão nas letras. Tem gente que primeiro tenta entender, tem gente que curte e dança pra depois analisar, e tem gente que só relaxa, deixa fluir e apenas sente. Nossa música é persistente, tem efeito residual e acumulativo nos corações e mentes de quem ouve e processa. 

No caso do álbum novo, fora uma barreira natural para quem não domina o inglês, que é relativamente fácil de transpor com um tradutor digital, o mais atrativo para mim é a curiosidade que ele desperta. Temos consciência que a identidade artística que desenvolvemos desde o início pode provocar estranhamento, curiosidade, questionamentos, reflexão... Tanto no Brasil quanto no exterior, os fãs retornam das mais variadas formas, demonstrando essa interação, seja com as letras, seja com as harmonias e melodias.


- Existem planos para o lançamento de “Dreams and Falls” através da MS Metal Records, atual gravadora de vocês, no formato físico? Tivemos acesso apenas ao formato digital por enquanto.

Gostamos bastante de lançar material físico, mas devido à tecnologia digital que vem tornando a distribuição por streaming predominante no mercado musical, ultimamente a dúvida em relação a esse tipo de investimento adicional é recorrente no segmento independente. 

Mas chegou essa proposta de parceria da MS Metal Records para viabilizar a versão física de Dreams and Falls. De início, será uma tiragem modesta, voltada a ações promocionais e um pequeno teste de mercado já está em etapa bem avançada de formatação e produção e em breve teremos mais detalhes.


- E como está a divulgação e aceitação fora do país?

Em “Dreams and Falls”, as canções originalmente escritas em inglês e as versões cuidadosamente elaboradas materializaram um conceito que reforça a identidade artística e musical da banda. Ao mesmo tempo, serviu como um teste pessoal e um marco em nossa carreira. 

Pelo que sei, estamos muito satisfeitos. Por fim, como há o propósito de projetar ainda mais a música que criamos para ouvintes de outros países, este novo trabalho também é uma experiência de posicionamento e projeção com a qual vamos aprender bastante. 

Concretizar esse projeto foi um desafio e um grande aprendizado, em muitos sentidos. 


- Como estão rolando os shows em suporte ao disco? A aceitação está sendo positiva?

Os períodos de lançamento de álbuns costumam não interferir em nosso ritmo de shows. Fazemos shows conforme as oportunidades aparecem, mas é claro que nesse período incluímos estratégias para promover nossas novidades, como a inclusão das músicas do álbum no repertório e alguns shows especiais para essa promoção. 

A receptividade nos shows condiz com o que vemos nas mídias sociais e imprensa, seja nas reações espontâneas, seja nos comentários que ouvimos do público. O que vimos nos shows realizados entre março e agosto deste ano foi um público bem caloroso, interativo e carregado de boas vibrações. 

Claro que as versões de músicas já conhecidas são mais fáceis de absorver e isso ajuda bastante na assimilação, porém ainda estamos no início da promoção das músicas do álbum e a realização de shows é uma ferramenta que movimenta. 

Porém, destaco que não temos condições de bancar por conta própria o investimento em uma grande turnê, apesar da vontade ser grande e estarmos abertos a propostas.


- Quem assinou a capa do CD? Qual a intenção dela e como ela se conecta com o título?

Bom, na verdade ninguém assinou oficialmente porque não teve um profissional específico, foi tudo por conta própria. Começou com a redução do custo de produção, vários esboços que Artur fez e nos mostrava, ouvindo as opiniões de todos, e foi avançando. A arte da capa tinha de representar o conceito embutido nas músicas e que vínhamos conversando para amadurecer. 

Um dia, Artur nos mostrou essa fotografia que depois descobrimos ser do Panteón, um monumento localizado no Cemitério de Montjuïc, Barcelona, de autoria de August Urrutia i Roldán, que destaca a escultura de um anjo abatido, está creditada a Josep Campeny i Santamaria. De cara a banda aprovou fez algumas sugestões para uma edição que adaptou a estética. Sem muita firula ou sofisticação, a capa enfim ficou pronta. E muito linda. Mas creio que o ponto forte está no significado que é até relativamente direto, mas conserva um toque de mistério. 

A imagem da capa retrata um momento de queda e abatimento, tanto físico quanto emocional. Pode ser dor ou sofrimento, mas o anjo está com as asas inteiras e acho que depende dele querer se reerguer e voar novamente. Não sei qual a intenção original ou qual mensagem do autor da escultura, mas acho que Artur tem razão ao analisar nossas reações e dizer que o valor artístico daquela obra se manifestou justamente quando inspirou nossa interpretação para gerar outra peça artística, nesse caso, a arte da capa do álbum. 

Na sequência, veio o resultado que convida e provoca o público para refletir, lembrar de seus próprios sonhos, colapsos e recuperações.

- “Dreams and Falls” foi todo produzido pela banda. Foi satisfatório seguirem por este caminho?

Sim, tudo por nossa conta e muito satisfatório, um processo de riquíssimo e intenso, em que tivemos um enorme aprendizado. Temos muita expectativa e curiosidade para conhecer como seria a reação dos ouvintes. 

Sabemos das limitações de uma banda sem recursos financeiros para ações de promocionais muito ambiciosas, mas creio que mesmo assim estamos positivamente surpresos com os comentários, matérias positivas publicadas no Brasil e no exterior (Estados Unidos, Inglaterra, México, Argentina, Chile, entre outros), músicas em playlists (algumas delas internacionais), veiculação em rádios e webradios, além de algumas entrevistas. 

Ele foi lançado nas plataformas digitais em março/2025. Como temos convicção a qualidade da produção e da seriedade do nosso esforço, seguimos firmes na divulgação.


- E vocês já estão trabalhando em novas composições? Se sim, como está se dando o processo e como ele está soando?

Sempre! A banda não para e temos muitas músicas compostas, várias prontas e guardadas para o futuro. De imediato, temos material gravado para mais duas produções inéditas: 01 álbum em português e 01 EP em espanhol. Estão na fase final de masterização, ambas ainda sem cronogramas de lançamento definidos. As músicas foram selecionadas depois de um conceito bem estabelecido e o processo de gravação trouxe novidades bem interessantes. 

As versões para o espanhol visam demonstrar nossa gratidão ao público da América Latina e da Espanha que tem sido muito carinhoso e bem receptivo em relação ao nosso som. O processo está acontece de maneira semelhante aos dois álbuns anteriores, mas incorpora novos aprendizados e técnicas. 

Em termos de sonoridade, queremos manter nossa identidade, mesmo com as novidades e a evolução constante. Ah, e as facetas continuarão a se revelar (algumas inesperadas), o que também é uma marca da banda.


- Novamente parabéns pelo trabalho e vida longa ao ORGANOCLORADOS...

Foi massa! Muito obrigado pela atenção e o espaço que nos deu aqui nessa entrevista, além desse retorno positivo em relação a nosso trabalho. Em nome da Organoclorados, um abraço e boas energias direto da Bahia.


Cobertura de Show: Hard N' Heavy Party – 30/08/2025 – Manifesto Bar/SP

O Heavy Metal, para todo apreciador que se preze, é reconhecido como um dos estilos mais pesados do planeta, com uma grande variedade de subgêneros. O mesmo vale para o Hard Rock, que apresenta diversas ramificações, como o Hair Metal, Glam, Melodic Rock, AOR e o mais tradicional. Desde os anos 1980, época de sua maior popularidade, o gênero evoluiu, mas sem perder sua essência. No Brasil, um país onde o rock infelizmente não recebe o devido valor, o estilo acabou ficando em segundo plano, salvo pelas lembranças de bandas como Kiss, Guns N’ Roses e Aerosmith. No entanto, a Hard N’ Heavy Party, que ressurgiu das cinzas há um ano, vem mudando essa história e mostrando que o Hard Rock vai muito além dessas referências clássicas.

Após um ano desde seu retorno, e com a mais recente edição realizada no último dia 30 de agosto, a Hard N’ Heavy já conta com quatro edições realizadas. Este que vos escreve esteve presente em todas elas, e nenhuma deixou a desejar: todas foram um sucesso. Isso prova que o evento se tornou, em um piscar de olhos, um compromisso obrigatório no calendário de shows não apenas do Brasil, mas de toda América Latina. A proposta é clara: trazer ao público artistas e bandas de Hard Rock que muitos sequer imaginavam ver ao vivo no país. E a tendência, segundo o idealizador Carlos Chiaroni, da Animal Records, é que venham ainda mais atrações inéditas nas próximas edições.

Para esta quarta edição, dois nomes já conhecidos em terras brasileiras foram trazidos, ambos com passagens marcantes por aqui e bom público em apresentações anteriores. Um deles foi o Eclipse, considerada uma das melhores bandas de Hard Rock da atualidade. O grupo retornou ao país um ano após sua apresentação na segunda edição do Summer Breeze (atualmente chamado de Bangers Open Air), realizando o desejo dos organizadores e matando a saudade de quem os viu naquele último dia de festival. O outro destaque foi Johnny Gioeli, um dos melhores vocalistas do gênero, embora ainda pouco reconhecido. Conhecido por seus trabalhos com o Hardline, Axel Rudi Pell e Crush 40, o cantor conquistou o público brasileiro já em sua primeira apresentação no país, em 2023, com um show lotado no House of Legends, localizado na Vila Madalena.

Assim como nas edições anteriores, a Hard N’ Heavy mantém como sua principal casa o Manifesto Bar, o mais importante rock club do Brasil, que desde junho está em novo endereço. Agora localizado no bairro da Vila Olímpia, o novo espaço é maior do que o anterior e realmente impressiona pela estrutura e visual, ficando à altura do que se esperava. 

Antes mesmo da abertura das portas, pontualmente aberta às 20h, uma fila já se formava do lado de fora. Cheguei a ter certo receio de que o público não comparecesse em grande número, já que o evento enfrentava uma certa concorrência naquele final de semana: o I Wanna Be Tour, no Allianz Parque, e o The 69 Eyes, banda de Gothic Rock que lotou o Fabrique Club no dia seguinte. Mas o temor foi infundado, o público veio. Gente de várias partes do Brasil e até da América Latina, como Colômbia e Argentina, compareceu em bom número. Ainda que não tenha lotado, o Manifesto ficou cheio o suficiente para criar um ótimo clima para os dois shows da noite.

Marcado para começar às 21h, o show de Johnny Gioeli acabou tendo um atraso de vinte minutos. Carlos, como de costume, fez seus agradecimentos, enquanto Bruno Luiz (guitarra, Command 6, The Heathen Scÿthe), Bento Mello (baixo, Nite Stinger, Sioux 66), Gabriel Haddad (bateria, Sioux 66) – a mesma formação que deu suporte ao vocalista em 2023, com exceção de Flavio Salin (teclado, The Heathen Scÿthe) – ocupavam seus postos. Sem nada combinado, Johnny acabou "queimando a largada" ao rasgar elogios ao amigo: “Esse aqui é um verdadeiro astro do rock”, disse Gioeli ao Carlos antes de começar o show com dois clássicos do Hardline, mais precisamente do álbum Double Eclipse (1992), uma das obras-primas do hard rock, com “Dr. Love” e “Takin' Me Down”.

Basicamente, o setlist contou com músicas de suas principais bandas, todas muito bem recepcionadas pelo público – de forma palpável, inclusive. Um exemplo foi “Long Live Rock”, escolha de Carlos, mas uma das que Johnny menos gosta, conforme ele mesmo comentou antes de anunciá-la. Ainda assim, foi um dos destaques da noite, com o público cantando o refrão com empolgação e Bruno, que naquele momento virou “Bruno Rudi Pell”, arrasando nos solos. Em seguida, “Live and Learn”, do Crush 40, também se destacou neste estupendo início, e olha que eu tinha minhas dúvidas quanto a ela, por se tratar de uma banda mais nichada, voltada ao público gamer, especialmente da série Sonic. Prova disso foi quando um sujeito jogou uma touca do personagem em direção a Johnny, enquanto ele, junto com a banda, performava esse clássico da banda nipo-americana (nipo por conta do guitarrista japonês Jun Senoue, fundador da banda). Um fato curioso, e que eu também não sabia, é que essa música está presente no último filme do Sonic, que tem Jim Carrey e Keanu Reeves como protagonistas, conforme explicou o vocalista.

As duas próximas músicas da noite vieram de álbuns menos lembrados do Hardline – Leaving the End Open (2009) e Human Nature (2016) – que mantêm a essência da banda, mas de forma mais melódica. A balada “In This Moment”, apenas com Johnny e Flavio no palco, trouxe uma bela mensagem sobre valorizar as coisas simples da vida. Nela, ficou evidente o quanto a voz de Johnny, que ecoou por todo o bairro da Vila Olímpia, é impressionante. Chega a ser uma injustiça um vocalista desse nível não ter mais reconhecimento do que já tem, talvez por ter surgido em uma época pouco favorável ao estilo. Sem muito tempo a perder, “Take Me Home” – com Flavio também assumindo os vocais – completou esse momento mais intimista da noite. Vale lembrar que ambas são de autoria do produtor, compositor e multi-instrumentista italiano Alessandro Del Vechio.

Dali em diante, o show seguiu com dobradinhas de Axel Rudi Pell e Hardline. “Oceans of Time” manteve o clima das duas anteriores, mas de forma épica, com a banda completa de volta ao palco. Vale lembrar que essa música, do disco de mesmo nome, marcou a estreia de Johnny na banda do guitarrista alemão, em 1998, e segue nela até hoje. “Carousel” – “essa sim eu adoro”, brincou o vocalista com Carlos – resgatou o clima festivo da noite, antes de revisitar duas obras do Hardline: “Fever Dreams”, do excelente Danger Zone (2012), e a empolgante “Everything”, mais uma do indispensável Double Eclipse (1992).

Em “What I'm Made Of...”, a última do Crush 40 no set, Johnny aproveitou para enaltecer a banda, que mais uma vez deu conta do recado com extrema excelência, mesmo com tão pouco tempo de ensaio. Caminhando para o final, Johnny preparou uma trinca matadora, começando com “Hot Cherie” – o originalmente composta por Danny Spanos, mas cuja versão do Hardline supera sem sombra de dúvida –, seguida pela ‘rockona’ “Rock the Nation”. Enfim, “Rhythm from a Red Car”, uma das minhas favoritas do Hardline, encerrou essa apresentação memorável.

Devido à agenda apertada, Johnny infelizmente não pôde atender o público ao final do show, mas só de vê-lo ao vivo em cima do palco já valeu cada segundo. Durante os pouco mais de 60 minutos de apresentação, o vocalista não poupou interação, empatia, olhares e sorrisos diante da plateia. Ou seja, como já dito anteriormente, um verdadeiro frontman, que reúne todos (e até um pouco mais) os requisitos de como um vocalista de rock deve ser. Torcemos para que ele volte novamente, quem sabe dessa com o Hardline ou com Axel Rudi Pell.

Uma rápida pausa para ir ao banheiro, rever os amigos, beber alguma coisa e explorar um pouco mais o novo Manifesto, que volto a dizer, ficou incrível. O ambiente continuava cheio, contando inclusive com a presença de algumas celebridades, como os bateristas Ricardo Confessori (ex-Angra e Shaman) e Marco Antunes (ex-Angra), os vocalistas Leandro Caçoilo (Viper) e Nando Fernandes (ex-Cavalo Vapor, ex-Hangar e Sinistra) e ninguém menos que Branco Mello, dos Titãs. Para quem não sabe, Branco é pai do baixista Bento Mello, e esteve no templo para ver o filho ao vivo. Só em lugares assim para se estar rodeado de boa música e boas companhias, não é mesmo?

Assim como o show do Johnny Gioeli, o início da apresentação do Eclipse também teve um pequeno atraso, mas nada absurdo, apenas o suficiente para nos deixar ainda mais ansiosos. Antes de falar sobre como foi o show, vale ressaltar que a relação da banda, vinda diretamente de Estocolmo, Suécia, com o Brasil já dura uma década e meia, muito graças ao forte apelo do Carlos, criador do famoso slogan “Eclipse Minha Vida”, ao qual eu também aderi.

É praticamente impossível achar algum defeito nessa banda: todas as músicas são boas, todos os discos são ótimos, e eles ainda têm em sua formação um dos maiores gênios da música na atualidade, Erik Martensson. Além do Eclipse, Erik também integra o W.E.T, ao lado de Jeff Scott Soto, e o Nordic Union, com Ronnie Atkins do Pretty Maids e Avantasia. Sim, pode parecer exagero o que estou dizendo, mas tudo isso é verdade. E ainda complemento toda essa minha empolgação afirmando que o Eclipse está entre as principais bandas de hard rock da atualidade, ao lado de H.E.A.T, Nestor e Crazy Lixx.

Sem mais delongas, após outra chamada do Carlos, o som mecânico da casa tocou trechos de músicas do Iron Maiden, Deep Purple, Megadeth, AC/DC, Rainbow, Scorpions e Mötley Crüe, até que o logo do Eclipse apareceu nas cores verde e amarela no telão da casa. Em seguida, Erik Martensson (vocal/guitarra), Magnus Henriksson (guitarra), Victor Crusner (baixo) e Magnus Andreasson (bateria) despejaram as primeiras notas de “Roses On Your Grave”, do álbum Wired (2021) – a mesma que abriu o último show da banda aqui no Brasil. Uma baita nostalgia, com a diferença de que desta vez não havia um sol escaldante sobre nossas cabeças. Em seguida veio “All I Want”, com sua pegada garage rock e vinda do mais recente Megalomanium II (2024), e “Run For Your Cover” – a mais celebrada desse início, com os primeiros ‘ô, ô, ô’ da noite – completaram essa trinca inicial, sendo ótimas escolhas para aquecer o público e preparar o terreno para as surpresas que viriam a seguir.

Antes de dar sequência, Erik disse suas primeiras palavras da noite, agradecendo a presença de todos e explicando que eles eram o Eclipse de Estocolmo, Suécia, para aqueles que ainda não os conheciam. No melhor estilo Bruce Dickinson, soltou um “Scream for me, Brasil!” e anunciou “Battleground”, do excelente Bleed & Scream – álbum que expandiu o nome da banda pelo mundo. A faixa foi bem recebida, assim como “Anthem”, do Megalomanium (2023), que teve seus primeiros versos cantados pela maioria dos presentes. A performance incluiu ainda um medley rápido de “Hotel California”, do The Eagles, e “House of the Rising Sun”, do The Animals.

“The Downfall of Eden” e “Runaways”, dos álbuns Monumentum (2017) e Armageddonize (2015), respectivamente, foram executadas com classe. Ambas refletem bem na identidade da banda, com guitarras pesadas, melodia na medida certa e refrãos pegajosos. A primeira, conforme Erik comentou antes de anunciá-la, é uma das favoritas dele e também da maioria que acompanha a banda. O mais legal, ao final, foi ver Erik incentivando todos a cantarem o último verso do refrão. “Saturday Night (Hallelujah)” – perfeita para uma noite de sábado como aquela –  e “Blood Enemies”, com Erik deixando a guitarra de lado por um momento, elevaram ainda mais o clima na pista e no camarote.

A grande surpresa, como já havia comentado, veio com a matadora “Wylde One”, do Are You Ready to Rock (2008). A música logo trouxe à memória a edição de retorno da Hard N’ Heavy, quando Erik, que naquela ocasião veio sozinho, a cantou depois de tantos anos. Mas, com o Eclipse completo, foi a primeira vez em muito tempo que ela apareceu no set, e nós, brasileiros, tivemos o privilégio de vivenciar essa performance tão contagiante. Espero que ela nunca mais saia do repertório da banda, pois é uma das melhores músicas da sua história. Até aqui, foram executadas músicas de praticamente todos os álbuns da banda. Digo “praticamente” porque dois deles ficaram de fora: The Truth and a Little More (2001) e Second to None (2004) – álbuns que, não sei por quais motivos, são sempre ignorados.

Conversando com amigos próximos, muitos concordam que a banda soa ainda melhor em lugares mais intimistas como o Manifesto. E eu assino embaixo, pois graças a essa proximidade, conseguimos sentir de verdade a energia que eles transmitem no palco. E falando da banda, ela é um ponto fora da curva. Erik, por quem sou suspeito para falar, merece todos os elogios possíveis. É, hoje, uma das pessoas que mais admiro dentro da música. Magnus deu um show com sua guitarra, entregando riffs e solos pra lá de envolventes. A cozinha mostrou firmeza do começo ao fim, contando com uma novidade temporária: o baterista Magnus Andreasson, ex-Hardcore Superstar. Sua performance foi muito elogiada na noite, mostrando uma pegada bem mais consistente que a de Philip Crusner, que preferiu ficar em casa assistindo TV e tomando cerveja.

Voltando ao show, o clímax veio com “Still My Hero”, música que Erik compôs em homenagem ao seu saudoso pai. Sozinho no palco, ele cantou e tocou de forma limpa, diferente da versão original, criando um dos momentos mais emocionantes da noite. A banda voltou ao palco tocando um trechinho de “We Don’t Celebrate Sundays” do Hardcore Superstar, uma referência clara ao baterista Adam Moore. Mas foi só uma rápida homenagem, porque logo em seguida veio “Falling to My Knees”, um dos primeiros singles do álbum mais recente, com direito a Victor Crusner cantando os versos iniciais.

A trinca final dessa primeira parte ficou por conta de “Stand on Your Feet” (outra que não era tocada há muito tempo), aa pesada “Black Rain” – que ainda teve uma palhinha de “The Sign of the Southern Cross”, do Black Sabbath – e da empolgante “Twilight”, que teve como destaque, em sua parte final, a incorporação da Nona Sinfonia de Beethoven.

Depois da tradicional pausa para um rápido descanso, a banda voltou para o bis de forma apoteótica. “I Don’t Wanna Say I’m Sorry” abriu essa segunda (e derradeira) parte da apresentação a mil por hora. Os palmeirenses de plantão tiveram motivo para comemorar nesse momento, já que o baixista Victor Crusner retornou ao palco vestindo a camiseta do Palmeiras – muito provavelmente, claro, ele deve ter ganhado de presente do Carlos, palmeirense assumido.

Assim como o Kiss encerra seus shows com “Rock and Roll All Nite”, o Guns N’ Roses com “Paradise City”, o Sepultura com “Roots Bloody Roots” e o Angra com “Carry On” e “Nova Era”, o Eclipse também tem uma música especial para fechar suas apresentações: “Viva La Victoria”. A pedido de Erik, o público pulou, cantou e gritou como se estivesse maluco, tudo para que ele realmente acreditasse que o Brasil tem o público mais insano do mundo. No finalzinho, Victor e Magnus trocaram seus instrumentos, e Adam puxou a clássica virada de “Stargazer”, do Rainbow, eternizada pelo saudoso Cozy Powell.

Mais uma edição para guardar na memória. O Eclipse, a cada ano que passa, vem elevando seu patamar dentro do hard rock e conquistando fãs ao redor do mundo, especialmente aqui no Brasil, país da América Latina com a maior base de admiradores da banda, por diversos motivos. Já Johnny Gioeli fez uma apresentação superior à de dois anos atrás, recebendo inúmeros elogios do público presente. Em resumo, ambos saíram com saldo positivo. No final, houve o show dos brasileiros do Nite Stinger, que estão prestes a lançar um novo álbum, como after party. Mas pouca gente permaneceu para assisti-los.




Edição/Revisão: Gabriel Arruda


Realização: DNA Rock Events

Press: ASE Press 


Johnny Gioeli – setlist:

Dr. Love (Hardline)

Takin' Me Down (Hardline)

Long Live Rock (Axel Rudi Pell)

Live and Learn (Crush 40)

In This Moment (Hardline)

Take You Home (Hardline)

Oceans of Time (Axel Rudi Pell)

Carousel (Axel Rudi Pell)

Fever Dreams (Hardline)

Everything (Hardline)

What I'm Made of... (Crush 40)

Hot Cherie (Hardline)

Rock the Nation (Axel Rudi Pell)

Rhythm From a Red Car (Hardline)


Eclipse – setlist:

Roses on Your Grave

All I Want

Run for Cover

Battlegrounds

Anthem

The Downfall of Eden

Runaways

Saturday Night (Hallelujah)

Blood Enemies

Wylde One

Still My Hero

Falling to My Knees

Stand on Your Feet

Black Rain

Twilight

Bis

I Don't Wanna Say I'm Sorry

Viva la Victoria