Há um conto na mitologia grega que é a de um pássaro que
após um período, constrói uma pira sobre qual posiciona-se para morrer. Do
corpo daquele pássaro nasce uma nova ave jovem pronta e destinada para viver
mais do que sua antecessora. Além disso, ela tem a capacidade de se reproduzir
sozinha. Os assírios a denominavam de Fênix.
No Brasil há uma história semelhante a essa, mas ao
contrário dos gregos, não é um mito, mas um fato. Um pássaro que após um
período ressurgiu de seu antigo corpo, mais agressivo e destinado a viver mais.
Ou como disse André Pars: "veio pra mostrar que não tá morto e que acordou
forte e barulhento". Através de seu profissionalismo respeitável e
exigente tem a capacidade de se reproduzir, isto é, tem a capacidade de possuir
identidade. Identidade chamada de "Máquina Thrash". Com vocês um bate
papo com: Panzer!
Road to Metal: Quando vocês estavam no inicio da carreira, o
cenário do Metal Nacional estava voltado para o Metal Melódico. Desde quando
Nightwish virou febre, surgiram (e ainda hoje surgem) bandas de Metal
Melódico/Sinfônico. A situação do Metal hoje em dia esta mais abrangente ou
vocês ainda sentem aquela pressão de que um estilo esta sendo mais visado que o
outro?
Edson: A moda sempre existe e sempre existiu, muita gente
que está dentro dela hoje nunca via admitir que está vivendo na onda do
momento, mas nós que estamos no cenário a mais de 2 décadas conseguimos ver isso
de forma mais clara. O Panzer nunca foi uma banda que teve a sorte de estar
fazendo o som do momento, porém sempre
acreditamos no nosso trabalho e somos reconhecidos por isso. Hoje é uma onda,
amanhã já é outra e nossa música permanece.
RtM: Os tanques de guerras nazistas eram chamados de
Panzer. Vocês escolheram tal nome por causa de seu significado. Mas quando a
Panzer surgiu, no início dos anos 90, o Brasil havia acabado de sair de uma
ditadura e ainda havia uma efervescência política. E em algum momento alguém
fez alguma ligação do nome da banda com o nazismo? Dizendo de outra forma, a
banda passou por algum constrangimento por causa do nome?
André: Por incrivel que pareça, nunca tivemos problema com
isso. Sempre deixamos claro que não somos simpatizantes das causas Nazistas e
que o nome é baseado no significado da palavra, que em alemão, significa algo
como “Couraça”, “Armadura”. Nunca nos envolvemos em causas políticas, até
porque não temos profundo conhecimento para argumentar sobre esses assuntos.
Acredito que isso tenha nos ajudado a desvincular o nome da banda com o
Nazismo. O Holocausto foi uma parte horrível e vergonhosa da história da humanidade,
mas deve ser sempre citado e lembrado, pra que não haja novamente. É importante
que o tema seja sempre discutido, lembrado e que cause desconforto. Só assim
não se repetirá.
RtM: Uma frase de um músico de jazz cai muito bem nessa
pergunta. Rex Stewart, nos anos 40/50 falava que "quando uma banda entra
em um estúdio para uma sessão de gravação, os caras não sentam para serem
sinceros. Eles tocam apenas. Só isso". Vocês não simpatizaram com a forma
de como um CD é gravado hoje em dia. Por que essa, digamos, antipatia com essa
nova forma de gravação? Ao ver de vocês falta sinceridade, como foi dito na
citação acima?
Edson: Eu particularmente não gosto da forma como a música
hoje é tratada dentro dos estúdios, realmente se você deixar a coisa andar como
todos querem que seja feito, tudo vai ficar realmente falso, matematicamente
perfeito, como robôs tocando de forma
irrepreensível. Essa vai sempre ser uma discussão sem fim sobre o que eu penso, de como a música deve soar e como técnicos e produtores entendem os conceitos
de gravação modernos. O engraçado é que os grandes clássicos, os discos
irrepreensíveis foram gravados de forma simples e até mesmo tosca, com poucos
canais, sem metrônomo, sem a parafernália de hoje em dia que fabrica heróis e
destrói o verdadeiro sentido da música que é expressão do sentimento humano.
Mas a tecnologia acabou com isso tudo, já ouvi muitas vezes dentro de estúdio
produtores dizendo... "mas tem que ser feito assim, porque o mercado exige isso
assim”. Ai eu pergunto, mercado?? Que mercado?? Ainda temos “majors" dando
diretrizes de como a musica vai ser?? Ainda temos grandes empresários
milionários?? Então eu acho que muitos músicos estão engessando sua música à toa, sendo escravos de metrônomos, programas de afinação de voz, edições de
áudio para criar música fria e sem sentimento. Sou contra isso e sempre vou
ser.
RtM: Um fato curioso entre o Jazz e o Heavy Metal é que
no final dos anos 70 e início dos 80 ouve um "revival" do Jazz,
embora grandes músicos de tal estilo já não existissem mais ou tivessem parado.
Atualmente bandas das antigas estão voltando ao cenário musical e podemos usar
o retorno de vocês como exemplo. Pois além da vontade de vocês retornarem com a
Panzer o público pedia para essa volta. Devido ao que vocês atribuem a volta de
tais bandas?
Edson: A volta do Panzer sinceramente não aconteceu devido a
onda mundial de volta de bandas. Esse foi um processo demorado, que durou
alguns anos de tentativas frustradas, distanciamentos pessoais e retomada de
velhas e grandes amizades do passado. Por acaso o Panzer retornou nesse
momento. Realmente existia uma parcela de velhos fãs que pediam a volta da
banda, existia nosso desejo secreto de que a banda voltasse, mas era preciso
este processo todo acontecer para que voltássemos com o trabalho na mesma
intensidade que deixamos a 10 anos atrás. Eu vejo que revivals são momentos
perigosos porque muita coisa não sobrevive, já o Panzer voltou para ficar,
retomar seu lugar no cenário e seguir adiante como banda que sempre foi.
RtM: Quando os músicos de uma banda se separam e vão
tocar em outras ou formar uma nova há uma
responsabilidade por parte de tais músicos tanto pelo seu trabalho
quanto pelo seu público. Mas retornar com a antiga banda, com sua formação
clássica, é diferente. Há mais
responsabilidade, há mais cobranças?
André: Pra ser sincero, quando voltamos com o Panzer, eu
senti-me em casa novamente. Sem pressões, etc... tudo soa muito tranquilo, e pra
mim, está sendo muito confortável tocar algo que eu e os caras criamos há
tempos. Eu não diria também que devemos
nos acomodar, muito pelo contrário... Já que a banda voltou, é pra ser
matadora!!! Fizemos um single com essa mentalidade, soltaremos um EP de fim de
ano da mesma forma [Nota do editor: entrevista realizada antes do EP "Brazilian Threat" ser lançado] e um novo álbum em 2013. A vantagem agora é que sabemos o
que queremos e essa é a nossa banda de coração. Quando você monta outra banda e
deixa algo muito bom pra trás, acaba, mesmo que inconscientemente, tentando
terminar o inacabado. Mas nesses novos projetos ou bandas, os músicos são
outros, as idéias não batem e a coisa acaba não saindo como deveria. E rola uma
frustração incomoda. Com a volta da banda, temos a chance de continuar algo que
a gente curtia demais, só que olhando pra frente. É daqui pra melhor. Esse é o
foco e é isso que as pessoas podem esperar do Panzer. Nunca seremos uma banda
acomodada e burocrática. Quando isso acontecer, é porque é hora de parar de vez...
RtM: No Brasil, o retorno foi bem aclamado. Teve um site
russo que fez um review do single "Rising" que vocês lançaram para
marcar a volta da banda. E no exterior como foi a recebida tal notícia?
Edson: Esta sendo bem recebida, entramos em playlists de
várias rádios Europeias e americanas e ainda ganhamos alguns bons reviews pelo
velho mundo. Mas é uma pena que ainda exista preconceito por parte das revistas
e sites europeus por material lançado via donwload como o single Rising, a
grande maioria da mídia gringa só resenha títulos lançados fisicamente em
CD. A mídia brasileira esta a frente a
mídia Europeia nesse sentido. Aqui não há preconceito e o material digital é
tratado por igual nas resenhas.
RtM: Uma curiosidade. Tem um filósofo que admiro o Henri
Bergson, afirma que 'cada filosofia deve ser compreendida a partir dela mesma',
isto é, sem comparações. Uma coisa que noto é que sempre tem um e outro pra
perguntar "qual é a influência de vocês?". Perguntas desse tipo não
são chatas para os músicos? Não seria melhor de que o entrevistador, ou seja,
lá quem for, prestasse atenção no som da banda e descobrisse, não as suas
influências, mas sim, a identidade dela?
André: Você matou a pau! Quando a gente faz um som, não fica
pensando se o som soa Pantera, se soa Sabbath, etc... embora as influências
existam e acabem sendo notadas no nosso som, o resultado final é PANZER e é
isso que queremos mostrar. Muitos sacaram isso, como você e muitos devem perceber
com o tempo, mas sempre existirão pessoas que necessitam da comparação para
julgar um material, seja ele qual for. Eu, por exemplo, sou um grande admirador
de cinema e adoro o trabalho do David Linch e não por isso, deixo de curtir
algo do Spielberg, que tem um trabalho completamente oposto. Não comparo,
justamente para aumentar o meu nível de percepção das coisas. O que é bom, é
bom e acabou... Se me toca, me emociona, me cutuca, me incomoda, etc, esse é o
meu termômetro... Não ouço um disco, e logo em seguida ponho um outro do qual
sou muito fã pra buscar semelhanças ou métricas de comparação. Quando isso
entrar de vez na cabeça das pessoas, o mercado musical se expandirá de uma
forma magistral.
RtM: Há músicos que preferem isolar-se na hora de compor para ter inspiração. E com vocês, como rola o processo de composição? Precisam de uma preparação ou é algo espontâneo?
André: Acredito muito na espontaneidade. Excesso de
preparação e lapidação podem arruinar um bom material... A nossa música reflete
o nosso momento. Se nos isolarmos e ficarmos dias e dias em cima de poucas
idéias, com certeza não sairá algo honesto. O clima urbano, os problemas, o dia
a dia, etc... tudo isso nos ajuda a escrever os novos sons. Rising é uma prova
disso. Ela mostra um PANZER que veio pra mostrar que não tá morto e que acordou
forte e barulhento. Foi uma música composta em uma tarde apenas... dois dias
depois, eu e o Edson estávamos tocando ela no estúdio na integra...
RtM: Algumas bandas colocam em primeiro lugar a música,
deixando as letras como algo secundário. Qual é a opinião de vocês sobre isso?
André: Sempre tivemos nas letras, uma preocupação muito
grande. Se você ler as letras do The Strongest, verá que essa preocupação é
latente nas nossas composições. O mesmo vale para o single Rising. A letra pra
nós, tem que ser forte como o som, senão, não faz sentido...
RtM: Algumas
bandas de Metal estão incrementando seu
som com efeitos tecnológicos até que duvidosos para tal estilo e quando não é
isso, aproveitam dessa "euforia" de cantoras no metal, para elevarem
a integrante da banda a símbolo sexual e assim promoverem-se. Como vocês
analisam o cenário do metal atual?
André: Se os aparatos tecnológicos forem usados para
expressar algo verdadeiro, não vejo problemas, pois isso será logo percebido no
som... Quando é algo feito pra agradar e aumentar o lado comercial, quem conhece de Metal logo
percebe. Um bom exemplo é o Rammstein, que usa elementos tecnológicos mas soa
visceral e real... Usar mulheres como símbolo sexual pra vender um som, só
determina o quanto o som da banda é fraco e ruim... Existem mulheres fantásticas
no Rock e com certeza, as melhores, nunca precisaram mostrar os peitos para se
posicionar como grandes artistas...
O Metal atual tem muita coisa boa, na sua grande maioria
feitas por bandas que já tem um bom tempo de estrada e por outro lado, tem
muito lixo. Mas como sempre foi, só os bons vão ficar... Essa avalanche de
bandas que surge a cada início de década é normal, mas a seleção natural se
encarrega de eliminar as porcarias. Foi assim no passado e sempre será. É
ciclo... Não há como fugir... Não se engana o público, principalmente o público
de metal, que é bem exigente, por muito tempo. E outra coisa, no estúdio se
faz miséria, agora, ao vivo a coisa pega. E é aí que começam a cair os que não
têm talento pra coisa...
RtM: A banda já
cogitou na possibilidade de gravar o primeiro CD, o "Inside" (1999).
Isso está ainda só na cogitação ou não?
André: Sim, gostaríamos de ouvir o material com uma gravação
de primeira... Isso não está descartado, mas não é o foco atual da banda.
RtM: Falando em
CD, o que vocês podem nos adiantar de novidades sobre CD, singles e afins?
André: O single sai em meados de dezembro [N.E.: vide nota anterior] e posso garantir
que trará um formato diferente e algumas surpresas. Será o nosso presente de
Natal aos amigos e fãs que tanto nos apoiaram nessa volta... E vai mostrar um
Panzer que muitos não conhecem... O novo álbum completo sai em meados de 2013.
Podem esperar que vem chumbo grosso aí...
RtM: No CD "Inside" vocês fizeram duas regravações: "Night Crawler" (Judaspriest) e
"Detroit Rock City" (Kiss). Num próximo CD vocês pretendem fazer
alguma regravação?
Edson: Aquilo foi uma piração nossa naquele momento, fazia
sentido gravar aqueles covers naquela época, chamar atenção para uma banda nova
que estava surgindo como nós. Hoje com o tempo de estrada que temos não faz
mais sentido incluir algo do tipo em nossos futuros lançamentos. Quem sabe um
dia um EP ou CD só de regravações,mas isso é algo para um futuro distante.
RtM: Há alguma
possibilidade do Élcio Cruz fazer uma participação especial num show ou quem
sabe num CD de vocês?
André: Só depende dele e do momento oportuno. Ele hoje mora
muito longe de nós e tem outros projetos em mente. Mas ele sempre será nosso
amigo e sempre terá espaço na banda. Ele é matador e canta muito, como o Rafael
também o faz com maestria. Mas são dois caras de escolas diferentes. Seria
legal, um dia eu ver os dois no palco cantando alguma coisa...
RtM: No dia 19
de outubro de 2012, no Blackmore Rock Bar (São Paulo/SP), houve o show que marcou o retorno da
"Máquina Thrash". Conte-nos como foi.
André: Esse show serviu para mostrar que ainda somos muito
fortes ao vivo. Quem viu gostou... Foi emocionante voltar aos palcos com o
Panzer após tanto tempo, ainda mais dividindo a noite com o grande Centúrias...
e o show foi muito bom... Fiquei feliz de estar de volta e fiquei muito
orgulhoso dos novos membros, que mantiveram a chama acesa. Voltamos pra
ficar.!!!
Quem quiser, pode ler a resenha do show que saiu no site
www.whiplash.net
RtM: Numa
entrevista vocês falaram que antes da banda terminar já tinham músicas
para o terceiro CD. Em 2007 foi lançado uma coletânea, a "Thrashed Machine
Collection". O que vocês fizeram com tais músicas? Colocaram nesse CD?
André: Não! Muitas músicas acabaram se perdendo no tempo e
muita coisa não teria sentido ser gravada agora.
RtM: No início
da carreira vocês tocaram em "buracos" como toda banda iniciante. Mas
depois de um tempo o que se tornou uma característica de vocês é de não tocarem
mais em "buracos". Muita banda exige do público, mas toca em qualquer
lugar e depois vem com discurso de "amor ao underground". Mas na boa,
qual prazer eu vou ter em ir escutar uma banda num local onde não tem uma
estrutura favorável? Achei muito admirável essa atitude de vocês, pois ao mesmo
tempo em que estão respeitando o público, estão demonstrando profissionalismo.
Fale mais sobre isso.
Edson: Nós sempre agimos assim, essa sempre foi nossa
atitude em relação a shows. E vamos continuar agindo dessa forma, porque o
músico deve se valorizar como tal. Investimos em gravações, bons equipamentos,
bons estúdios de ensaio para que? Para darmos nossa música de graça? Música é
um trabalho como outro qualquer, que deve ser feito dentro das condições onde
você consiga apresentá-la de forma ideal e com remuneração por isso. E agindo
dessa forma garantimos ao público sempre um show de qualidade, que vale pelo
que ele paga.
RtM: Complementando a pergunta anterior, numa entrevista vocês falaram que o Metal
Brasileiro nunca teve apoio e ainda não tem. Será que se algumas bandas
deixassem pra trás aquele discurso de "underground" e fizessem tal
exigência o Metal Nacional não seria mais valorizado? Pois ai a galera iria ver
que o que eles fazem no CD, fazem ao vivo também.
Edson: O termo underground hoje é algo muito delicado. Tem
muitas bandas e muita gente que escolhe ficar dentro dos limites do que hoje se
entende de underground atualmente. Isso sempre foi uma questão polêmica. No
Panzer nós sempre trabalhamos para fazer um trabalho honesto e vinculado a
raízes muito bem definidas por nós. Nossa meta sempre foi fazer a banda crescer, apenas se importando com a honestidade de nossa musica. Assim podemos nos
valorizar e trabalhar da forma como entendemos correta para nós.
RtM: Quero agradecer à vocês pela oportunidade de fazer essa entrevista. E agora deixo
este espaço para vocês.
André: Nós é que agradecemos a oportunidade e respeito. O que tenho a dizer, é que não voltamos com a banda, simplesmente por voltar. Voltamos para fazer novamente o que mais amamos, que é
tocar som pesado. E isso, com certeza vai se refletir nos nossos futuros
lançamentos...
Valeu a força e foi muito legal responder a perguntas tão
inteligentes e oportunas.
Edson: Valeu pelo espaço dado para podermos falar de nossa
história!!! Agradeço a todos pelo apoio dado a banda!!
Entrevista e edição: Luiz Edmundo
Revisão: Eduardo Cadore
Panzer é:
Rafael Moreira (Vocal)
Rafael DM (Baixo)
André Pars (Guitarra)
Edson Graseffi (Bateria)
Panzer é:
Rafael Moreira (Vocal)
Rafael DM (Baixo)
André Pars (Guitarra)
Edson Graseffi (Bateria)
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