domingo, 13 de abril de 2025

Cobertura de Show: Atheist


 
O ano corrente foi iniciado com uma leva de promessas para todos aqueles que possuem uma afeição pelo Metal extremo, e apesar de estarmos no 1º trimestre, pode ser observado que as promessas felizmente estão sendo acompanhadas das entregas também.

Mais recentemente, os apreciadores do "Metal da Morte" foram agraciados com 2 nomes que são um testemunho do quão experimental o Death Metal veio a se tornar desde a sua concepção nos anos 80, sendo tão iguais e tão diferentes ao mesmo tempo: os norte-americanos do Atheist e os canadenses do Cryptopsy, nomes estes que não davam as caras em terras brasileiras há anos.

Com o assalto tendo local marcado (o Fabrique Club, no bairro da Barra Funda), esta dupla de bandas teve a missão de oferecer uma noite que, apesar do grande calor devastar a capital paulista, provaria ser fora do usual: cortesia da união entre a Chamuco, Xaninho Discos e a Caveira Velha Produções para trazer um casal de veteranos do "Tech Death".


ATHEIST

A Presença Deles É, De Fato, Inquestionável

Formada um pouco antes da nossa atual Constituição Federal ser promulgada, o ATHEIST é visto como um dos precursores do Death Metal Técnico, com a sua mistura incomum de jazz com elementos progressivos e até de Thrash Metal aliados ao seu som base.

A mencionada mistura foi usada como referência para outros atos considerados como influentes dentro não só do nicho ao qual faz parte, mas fora dele também: sendo um dos principais o DEATH, do lendário Chuck Schuldiner, que ajudou a moldar o que o seu som veio a ser a partir do icônico Spiritual Healing.


Ainda que com um atraso, o quinteto composto por Kelly Shaefer (vocal), Jerry Witunsky (Guitarra), Alex Haddad (Guitarra), Yoav Ruiz-Feingold (Baixo) e Steve Flynn (Bateria) gradualmente foi subindo ao palco sob o som proposital de In The Flesh, do Pink Floyd. Proposital porque ela ajuda a estabelecer a tonalidade psicodélica que envolve os contos audíveis oferecidos pelo ATHEIST, capaz de colocar a mente de quem os escuta em estado de transe.

Nascida através de uma demo, a abertura ficou por conta do encerramento do fantástico Piece of Time (lançado em 1990): NO TRUTH, e foi aqui que todos os músicos assumiram os seus postos. Kelly Schaefer, SEMPRE exalando bom-humor, já chegando soltando um "ei, ei, ei!" para soltar um barulho da multidão presente, que infelizmente ainda tinha muito lugar a ser preenchido no Fabrique Club.



O que iria ser visto daqui em diante era uma volta por uma passagem do tempo (trocadilho intencional), sendo o foco central os três primeiros trabalhos deles: Piece of Time, Unquestionable Presence e Elements. Se o anime Cavaleiros do Zodíaco chegou a despertar o seu interesse por astronomia, o mesmo potencial pode ser encontrado aqui, em formato musical, pois uma definição apropriada do ATHEIST seria "bestialidade audível com finésse cósmica".

Havia uma certa timidez para a criação de moshes dentro da casa, e era um tanto justificável, devido ao fato dos que estavam ali presentes se encontravam em estado de espanto ao estarem diante de verdadeiros professores ministrando uma aula de "Como Performar Death Metal Fora da Caixa", especialmente em ON THEY SLAY.


O baixista Yoav já estava ligado nos 220v desde que o show iniciou, e considerando que UNHOLY WAR é uma pura barricada sonora impiedosa, ele ficou de um lado ao outro no palco, sempre com a infame posição do dedo indicador direito levantado em movimentação circular, ordenando a formação de moshes, que gradualmente foram acontecendo.

A expressão popular "de 8 a 80" é mais do que apropriada para ser usada aqui, pois quando alguns dos sons de Elements tomaram conta do repertório, o ATHEIST demonstra a sua veia mais experimental com elementos progressivos e a influência pesadamente orientada do jazz, podendo ser visto sem esforço algum em MINERAL. Tudo isso casado com o peso tradicional do Death Metal, e explicando em atos o motivo do quão diferenciado e influentes os combatentes vindos dos Estados Unidos são.



Não havia muitas pausas e discursos entre uma pedrada e outra. Unquestionable Presence é o álbum favorito de muitos que ouvem o quinteto, mas somente perto da metade da apresentação que ele veio a marcar presença. Se lembra da influência que eles causaram no DEATH, mencionada lá em cima? Unquestionable Presence tem grande parte da "culpa" nisso, aparecendo nas formas de ENTHRALLED IN ESSENCE e YOUR LIFE'S RETRIBUTION. Foi a partir daqui que Schaefer elevou a sua agitação e, no meio das suas interações com o público, convidava gentilmente o público a "bangear", dizendo: "batam as suas cabeças, porra!".

AIR e FIRE, ambas do Elements, apresentam uma dualidade que talvez tenha sido uma piada interna colocarem uma em sequência da outra. AIR é uma declaração de intenção, que, para estar no ATHEIST, cada musicista precisa ser bom, onde cada instrumento aparenta ser uma extensão do corpo de cada um, com uma introdução calma, quase caleidoscópica, até que eventualmente chega ao estado de uma nevasca em atividade. 


FIRE, outro dos elementos naturais, possui uma abordagem mais agressiva, sendo bem mais "na sua cara", além de um vocal mais grave. Isso não excluiu, porém, a possibilidade de FIRE incluir as suas tradicionais passagens de jazz e até mesmo Fusion (algo que Paul Masvidal usaria com grande efeito no CYNIC).

Após mais da metade da performance ter acontecido, e o próprio Kelly se autoentitular como um "estadunidense estúpido" pelo seu vocabulário em Português ser composto apenas pela palavra "obrigado" (embora isso já diga mais do que aqueles que acreditam que o Brasil tem o Espanhol como a sua língua nativa), um destaque é merecido para I DENY: uma dedicatória a Roger Patterson, baixista da formação original que faleceu prematuramente, dando aquele clima tocante no ar. 

Deve ser notado que é neste momento em que Kelly orgulhosamente aponta para Yoav Ruiz-Feingold, dizendo que ele é o melhor baixista do ATHEIST desde a partida de Roger.



A trindade de maior hype entre os entusiastas do ATHEIST ficou para um final triunfante: Unquestionable Presence, Mother Man e a faixa-título do primeiro lançamento Piece of Time, anunciando o final desta autêntica viagem mental e extracorpórea, capaz de fazer o ouvinte questionar quanto tempo se passou desde que o "passeio" começou.

Após os carros-chefe dos iniciados pelo ATHEIST, vimos uma despedida levemente prolongada por parte dos seus membros, nesta que foi somente a segunda vez deles no Brasil. Mesmo com a casa tendo espaço suficiente para mais pessoas povoarem, isso não impediu o semblante de agradecimento pelo quinteto, cuja passagem certamente será carregada por uma miríade de características capazes de descrever que... sim, a presença deles foi, de fato, inquestionável.



Nota: há uma música chamada Samba Briza em seu histórico, e ela não foi reproduzida aqui. Samba Briza. Brasil.

O motivo para isso está além da minha compreensão.

Texto e fotos: Bruno França 
Edição/revisão: Caco Garcia 

Setlist

1) No Truth
2) On They Slay
3) Unholy War
4) Water
5) Mineral
6) Enthralled In Essence
7) Your Life's Retribution
8) Air
9) Fire
10) Brains
11) Room With A View
12) I Deny
13) Unquestionable Presence
14) Mother Man
15) Piece of Time

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