DARK DIMENSIONS FEST: UMA AMOSTRA DO QUE O ANO CORRENTE ESTÁ PARA TRAZER A TODOS NÓS
No ano de 2025, a produtora Dark Dimensions celebra os seus 25 anos de existência. Um marco desses poderia ser comemorado de maneira "ordinária", mas diante dos períodos constantes de testes e de tribulações que estamos submissos quando se fala em ficar vivo não só no ramo da música, e considerando o nicho do Metal em um país com as dificuldades como o Brasil possui neste segmento, este definitivamente não é um feito qualquer.
E obviamente, o Rock como um todo sempre teve uma característica basilar de inclusão. Bem antes dessa pauta tomar as discussões acaloradas no dia-a-dia, seja de maneira presencial, seja no ambiente de campo de batalha que são as redes sociais, reforçando a sua característica como CONTRACULTURA, o âmbito do Metal historicamente acolheu aqueles enquadrados como "minorias".
Tempos atrás, o mais esperado era apenas citar os nomes mais comuns quando se trata de representação feminina dentro desta subcultura, como Ângela Gossow e Simone Simmons. Os mais experientes soltariam uma Sabina Classen ou as pioneiras da GIRLSCHOOL. Nos dias de hoje, porém, a realidade tem sido mudada como uma presença consideravelmente maior do que víamos num passado parcialmente recente.
Em grande parte, um dos agentes responsáveis para esta mudança de paradigma é a poderosa NERVOSA, banda que começou o seu trajeto no ano de 2010 com um Thrash Metal bem "na sua cara", e hoje em dia pode ser categorizada como uma das principais expoentes internacionais do gênero.
Em luz de eventos recentes, a Dark Dimensions aproveitou o momentum frontal para uma celebração específica em pleno dia de aniversário da cidade de São Paulo, culminando com o 1º Dark Dimensions Fest. Reunindo o estabelecido TORTURE SQUAD, as em crescimento ESKRÖTA, THE DAMNNATION e THROW ME TO THE WOLVES, o festival contou com a 1ª aparição em terra tupiniquim dos australianos do ELM STREET. A headliner foi a supramencionada NERVOSA, celebrando o seu aniversário de 15 anos, o que só enfatiza o fato deste ser um legítimo zeitgeist.
THE DAMNNATION
Os portões do Carioca Club foram abertos para todos precisamente às 14:11, pouco após do horário estabelecido, com um calor digno da estação do Verão castigando a fila que se encontrava preenchendo a esquina para o rolê do dia.
Nos perímetros de consumação da casa, os itens esperados à venda estavam disponíveis: camisas, patches, CD, discos de vinil... as opções eram numerosas.
Tais atrações serviram para ajudar a passar o tempo até a marca pontual das 14:30, ocorrendo a 1ª abertura das correntes na tarde escaldante de Sábado para o ato inicial do festival: a THE DAMNNATION.
Mesmo com o horário cedo, havia um pessoal já presente na famosa casa de shows do Pinheiros, por mais tímido que fosse. O trio formado em 2019 por Renata Petrelli (vocais/guitarra), Fernanda Lessa (baixo) e Leonora Mölka (bateria) começou os trabalhos com uma abordagem mais direta, sem muitas cerimônias, com PARASITE. Um ponto diferencial é que, ao contrário da maioria das oferendas do tipo, é possível ouvir claramente a nitidez de cada instrumento da mescla de Thrash/Death entregue por elas.
Por mais que a presença do público estivesse ainda acontecendo, isso não impediu que Renata prestasse consideração por aqueles que já se encontravam no recinto, trajando uma respeitável camisa do KING DIAMOND.
Assim como em ABSU (porém de maneira atenuada, pois o baterista é o vocal principal), outro diferencial do THE DAMNNATION é ouvir segmentos vocais vindos da bateria de Leonora, e WAY OF PERDITION serviu para soltar um ritmo que gradualmente se elevava, o que iria pintar um clima que estava marcado no horizonte para as horas que o Dark Dimensions Fest duraria.
APOCALYPSE foi a última entrega do trio, um puro suco de Thrash Metal que toma proveito de uma clareza mais moderna, sem ignorar a forte influência vista dos primórdios do SEPULTURA.
Como em uma apresentação de teatro, as cortinas se fecharam para provocar a multidão com uma sensação de curiosidade com que acontecera nos bastidores, até a chegada da próxima atração. Este modus operandi seria uma constante por toda a duração deste evento, para que também fosse possível mirar as atenções com certas necessidades sociais e biológicas que vem com o território de um festival.
The Damnation – setlist:
Parasite
World's Curse
Grief of Death
This Pain Won't Last
Way of Perdition
Unholy Soldiers
Slaves of Society
Apocalypse
THROW ME TO THE WOLVES
O que foi visto aqui seria a última vez que veríamos o início ser dado no horário pristinamente estabelecido, já que certos imprevistos começariam a participar durante o desenrolar do festival, o que não chega a ser algo fora do habitual. Exatamente às 15:30, o palco estava povoado com os membros do 2º ato programado do Dark Dimensions Fest: o THROW ME TO THE WOLVES, a mais nova do elenco.
A abertura instrumental serviu para gerar uma continuação com CHAOS, e com o tocar das primeiras notas, os mais iniciados no Death Metal Melódico podem sacar que a inspiração que reina o quinteto vem da cena de Gotemburgo dos anos 90 lá da Suécia, personalizadas por nomes como DARK TRANQUILITY e IN FLAMES.
Por conta disto, não só por ser formada há pouco tempo, mas eles são o que menos fazem parte da predominância do Thrash, o que coloca um destaque a parte para a banda que tem apenas pouco menos de 2 anos de idade. Levando em conta como as canções são estruturadas, ponto bastante positivo por deixar que cada membro consiga ter seus momentos de destaque, em linhas gerais.
Seja em TARTARUS ou em GATES OF OBLIVION, não faltou demonstração técnica e movimentação constante entre todos os instrumentistas de cordas e do vocalista Diogo Nunes com um ótimo alcance vocal.
Gui Calegari e Lucas Oliveira formam os chamados "gêmeos das guitarras", alternando ocasionalmente entre melodias e solos, colocando seus nomes para se prestar atenção num futuro próximo pelo que fora apresentado aqui. Rodrigo Gagliardi complementa apresentando uma performance de presença, e com Maycon Avelino na posição de baterista, eles certamente vieram para ficar.
É de se lembrar que GAIA conta com a participação especial do vocalista Bjorn "Speed" Strid (conhecido pelo SOILWORK e pelo THE NIGHT FLIGHT ORCHESTRA).
Tendo já feito entusiastas no meio da vastidão, THROW ME TO THE WOLVES é um nome que ainda será pronunciado aos ouvidos dos participadores da cena, em especial quando seu álbum de estreia for lançado ainda em 2025, entitulado Days of Retribution.
Throw Me To The Wolves – setlist:
Intro
Chaos
Tartarus
Days of Retribution
Gates of Oblivion
Fragments
An Hour of Wolves
Gaia
ESKRÖTA
Com o fim iminente da apresentação anterior, era possível observar um aumento na movimentação num dos locais mais famosos do bairro Pinheiros. Em uma reprise, as cortinas se mantinham fechadas para a construção de suspense entre o que acontecia nos bastidores.
No horário exato das 16:28, a abertura das cortinas tornou a acontecer, revelando os dizeres E.S.K.R.Ö.T.A., cujo trio experiencia uma ascensão considerável, tendo tocado recentemente no ROCK IN RIO e no KNOTFEST BRASIL, e feito uma turnê com o NAPALM DEATH pela América Latina no fim do ano que se passou.
Vindo do interior paulista, o trio conta com Yasmin Amaral (vocais e guitarra), Tamyris Leopoldo (baixo e backing vocal) e Jhon França (bateria), entregando um som como se fosse um "Megazord" de Crossover, Thrash Metal e Hardcore, sendo talvez a mais diferente das 6 bandas.
A abertura com GRITA já mostra algumas características que se tornaram marga registrada da ESKRÖTA: letras ácidas, críticas e políticas, casadas com um som bem cru e direto. Em uma tentativa de promover atitudes contra platitudes, desde o show no KNOTFEST se tornou tradição ver uma leva de bolas infláveis que contam com o logotipo do super trio voando pela plateia.
E neste meio tempo, a vocalista e guitarrista Yasmin aproveita a oportunidade para comentar sobre o quão importante é o serviço promovido pelo Dark Dimensions Fest, por trazer uma participação feminina maior diante de um cenário que ainda se mantém desproporcional no caso em tela.
Reais hinos como ÉTICAMENTE QUESTIONÁVEL e CENA TÓXICA evidenciam as supramencionadas características do que se pode esperar de uma entrega da ESKRÖTA, e PLAYBOSTA já alcançou a condição de um clássico do conjunto de São Carlos e Rio Claro.
Porém, nem só de letras com cunho político compõem o seu arsenal. Com inspiração em filmes de terror, NÃO ENTRE EM PÂNICO é uma das armas vistas em seus shows, com a participação de Vicki fazendo o papel do personagem Ghostface, tanto no palco como nas rodas de mosh.
FILHA DO SATANÁS, como de costume, mostrou ser o epicentro da apresentação, com uma descarregada magnificada de energia, sem perdoar qualquer ser vivo que estivesse em seu trajeto de ataque. O encerramento ficou por conta de MULHERES, culminando com uma passada de mensagem executada com sucesso, sem contar um wall of death similar a um arrastão elevado à décima primeira potência.
Seja pelo acaso ou por design, o uso do personagem Ghostface acabou criando um tipo de gancho para o que estava por vir em seguida, deixando a partir deste ponto com que o festival chegasse à metade das atrações.
Eskröta – setlist:
Grita
Playbosta
Cena Tóxica
Episiotomia
Não Entre Em Pânico / Exorcist in the Pit (com participação de Vicki, como Ghostface)
Homem É Assim Mesmo
Mosh Feminista
Éticamente Questionável
Instagramável
Filha do Satanás
Massacre
Mulheres
ELM STREET
Pelo nome da desconhecida ELM STREET, um pode adivinhar que faz referência ao famoso filme do Freddy Krueger, "A Hora do Pesadelo" (Nightmare On Elm Street), e esse palpite estaria correto. Vinda da Austrália, ela possui algo em comum com a ESKRÖTA: foco em filmes de terror. E tem algo em comum com a NERVOSA também: eles as acompanham abrindo para a banda brasileira na turnê de 15 anos na América Latina.
Na marca exata das 17:26, se iniciou a 1ª aparição dos australianos aqui no Brasil, iniciando com A STATE OF FEAR através de um Heavy tradicional com toque moderno. Pode-se perceber aqui que a predileção por filmes de terror fica cravada nas temáticas das composições, não na estética em si. E sem demorar muito, Aaron Adie (guitarra) puxou as atenções para si com uma quantidade impressionante de solos cativantes.
Pairava um certo ar de incerteza e curiosidade entre o público presente, o que fez com que Nick Ivkovic (baixo) ficasse se "movendo nos 220v" para agitar o recinto, por várias vezes se colocando no ponto de limite que separa o palco da pista central, interagindo freneticamente, sem perder uma batida.
Ben Batres (vocal/guitarra) se prontificou em deixar claro que, apesar do nome fazer alusão a um pesadelo, não seria onde estaríamos dentro, mas sim o de um sonho de Heavy Metal tradicional com pitadas de Speed, como ocorre em HEART RACER.
Para deixar todos mais familiarizados com os membros, eles inteligentemente possuíam em seu repertório um cover do IRON MAIDEN na forma de RUNNING FREE, tudo enquanto entregavam um instrumental muito bem elaborado, o que pode fazer muitos se perguntarem o que os levaram a não terem vindo ao Brasil antes.
O mencionado instrumental era complementado por Tomislav Perkovic, que esmurrava a sua bateria com a força proporcional do seu tamanho físico.
Por fim, com uma menção honrosa a DIO, a finalização ficou por conta de METAL IS THE WAY, se consolidando como uma opção acertada e que provará surpreender aqueles que dedicarem seus tempos para conhecerem algo novo e de qualidade aprovável.
Talvez não tão nova assim porque eles já possuem um pouco mais de 15 anos de idade, o que não elimina a possibilidade de ser uma boa descoberta para quem se dispor a conhecê-los.
Elm Street – setlist:
A State of Fear
Face The Reaper
Heart Racer
Elm St's Children
Take The Night
The Last Judgement
Behind The Eyes of Evil
Running Free (Iron Maiden Cover)
Barbed Wire Metal
Heavy Metal Power
Metal Is The Way
TORTURE SQUAD
O TORTURE SQUAD não ser o headliner do evento não muda o fato de ser uma atração que sempre chama a atenção onde irá realizar uma apresentação. Afinal, quando estamos falando de veteranos com décadas de experiência que dignificam o nome do Brasil mundo afora no cenário da música extrema, é natural a criação de uma receita que tem um ingrediente básico como o seu alicerce: ouvintes que praticam a tática da fidelidade como se fosse uma necessidade natural do corpo humano, como dormir ou se alimentar.
Isso é evidenciado pelo fato de que ao redor deste momento, o Carioca Club se aproximou da lotação máxima para que todos possam ver melhor o que pode ser aprendido por esta instituição nacional do Thrash Metal. Algo que já foi aprendido, no entanto, é testemunhar um show com um ritmo bem energético, com headbangings acelerados e um teste à capacidade dos equipamentos de som, caso aguentem o tranco.
Desde o lançamento do trabalho mais recente, DEVILISH, se tornou um padrão a abertura ficar por conta de HELL IS COMING, oportunidade para a vocalista Mayara Puertas demonstrar a ampliação do seu escopo como musicista ao não ficar apenas na tarefa vocal, e sim ao ser acompanhada pelo elemento do violão. Para além dela exalar uma voz limpa, assim que ela solta a sua gutural necromântica, você entende o motivo dela ser professora nesta modalidade de canto, personificando aquela valia da vida de que ações valem mais do que palavras.
Antes do anúncio de ABDUCTION WAS THE CASE, houve a menção respeitosa sobre o falecimento recente de Cristiano Fusco, por motivo de câncer. Em sinal cortês, este foi o momento de prestar a devida homenagem pelo fundador da banda com uma de suas favoritas.
Outro ponto de foco antes que RAISE YOUR HORNS fosse tocada é a contemplação do que acontece quando alguém alcança um nível de excelência por dedicação contínua. Em um solo destruidor e de gerar admiração, não é à toa que Amílcar Christófaro é visto como um dos melhores bateristas em seu ramo em solo brasileiro, com uma habilidade quase descomunal por trás do seu kit.
WARRIOR possui um propósito triplo: não só foi o momento para elogiarmos o técnico de som, que permitiu com que as sólidas linhas de baixo de Castor fossem claramente audíveis, tornando a sua possível ausência notada, como também alterou o ar da apresentação com uma vibe mais Hard Rock.
Foi aqui que a icônica Leather Leone (mais conhecida pela sua estada na CHASTAIN) foi convidada ao palco para dar ainda mais vigor com a sua presença exótica, ao passo de que Mayara mostrava uma vez mais seu vocal limpo e a multidão vibrava consideravelmente enquanto Leather tentava arrancar um Português.
Em HORROR AND TORTURE, além de MURDER OF A GOD antes dela, vimos oportunidades para René Simionato performar riffs frenéticos e impactantes enquanto se agita constantemente entre as dimensões do palco e nos pontos limítrofes do mesmo, ligando-se com a multidão ao redor.
Foi através de muito suor, trabalho e esforço que o TORTURE SQUAD chegou ao patamar que hoje possui erguido, e assistir um show com um nível assustadoramente exemplar de profissionalismo e de produção é razão para se ter gosto em ser um headbanger. Com a mesma certeza de que o Sol iria nascer após algumas horas, muitos chifres foram erguidos não como um procedimento qualquer, mas por um senso de orgulho.
Em atmosfera explosiva, assim foi finalizado o último ato com a clássica THE UNHOLY SPELL antes da chegada do último motivo para o rolê do dia, o que fez com que surgisse a dificuldade comum em se movimentar aos arredores da casa de shows, pois o limite de pessoas foi atingido.
Torture Squad – setlist:
Hell Is Coming
Flukeman
Buried Alive
Abduction Was The Case
Raise Your Horns
Murder of a God
Warrior (com a participação de Leather Leone)
Pull The Trigger
Horror And Torture
The Unholy Spell
NERVOSA
...E assim chegamos ao chamativo central da noite. Uma vez mais, as cortinas se mantinham fechadas para a produção de ânimo e animação generalizada entre todos ali presentes.
Desde a abertura dos portões até chegarmos aqui, mais de 6 horas haviam se passado do festival, e era fácil observar que a casa estava lotada para presenciar algo que logo provou ser um autêntico evento.
Ainda que com um atraso considerável, na marca precisa das 20:25, a escuridão completa tomou conta do local e o começo em playback da memorável SEED OF DEATH era a audição dominante, com a abertura das cortinas ocorrendo em ato contínuo. Tal abertura aconteceu com um barulho quase ensurdecedor por parte dos expectadores, ansiosos por verem a headliner desta comunhão do Metal.
- A PAZ ENVOLVENTE NUNCA FOI UMA OPÇÃO
A introdução sozinha de SEED OF DEATH pode significar uma miríade de coisas. Como o meme de internet da franquia Street Fighter "O Tema de Guile Combina Com Tudo", ela pode suplicar por um senso de empoderamento o qual as palavras falhariam em traduzir. Ou uma manifestação sonora de um renascimento das cinzas, como a ave mitológica Fênix, talvez? Este é um dos vários efeitos que a música causa no corpo humano, já que dificilmente é a mesma sensação em indivíduos diferentes.
Uma regra não escrita do universo é que a tranquilidade é sempre ameaçada pela tempestade. Com a abertura das cortinas pela última vez no dia, era possível ver Gabriela Abud lá atrás, recém-completando o seu 1º ano na NERVOSA e exalando o seu carisma quase imensurável, observando a todos por trás do seu kit. A grega Helena Kotina entrou no palco logo na sequência saudando a todos, e simultaneamente para a surpresa do povo, a holandesa Emmelie Herwegh surgiu para realizar as tarefas do baixo, substituindo Hel Pyre já no passado e aqui novamente.
Completando o quarteto, a guitarrista e fundadora Prika Amaral surge para elevar a euforia da multidão com um cumprimento que já se tornou a sua marca registrada.
Se lembra da tranquilidade ameaçada, dita agora há pouco? É exatamente o que acontece com o final da introdução da música mencionada acima, já que o Carioca Club estava na iminência de ser tomado de assalto.
- CUIDADO! OUVIR NERVOSA PEDALANDO O(A) FARÁ ULTRAPASSAR CARROS!
O esforço multinacional composto pela trindade Brasil, Grécia e Holanda se prontificou em estabelecer a tonalidade do que iria ser desvendado com a promessa do maior repertório até então executado pela NERVOSA; promessa esta que foi cumprida. Uma duração apropriada para o 1º show de celebração dos 15 anos de aniversário de um autêntico quarteto fantástico.
Para uma apresentação diferenciada, o repertório fez um passeio por todo o histórico da NERVOSA. Victim of Yourself, Agony, Downfall of Mankind, Perpetual Chaos, e naturalmente, o álbum mais recente: Jailbreak. Todos os álbuns da discografia estiveram presentes na incrível quantidade de 19 músicas apresentadas no total.
Por ser o mais recente, o alvo dos holofotes foi justamente Jailbreak (que inclusive, consta no nome da turnê de 15 anos), álbum composto durante um período muito peculiar em seu trajeto, cujo título pode ser descrito como um grito primal de liberdade.
Merece ser lembrado que, em entrevistas e coletivas de imprensa nos dias que antecederam o início dos shows em solo latino, o show de São Paulo em específico contaria com algumas surpresas únicas, o que desenhou um clima de especial logo para a 1ª data brasileira. Previamente revelado foi que o show da capital paulista seria filmado para a posteridade.
Quando BEHIND THE WALL sucedeu a abertura, certas características se tornaram um padrão: o senso de realização e alegria ao estarem ali presentes no solo do Carioca Club, porque a história não só da NERVOSA, mas do Metal nacional estava sendo feita naqueles minutos.
- AS HERDEIRAS DIRETAS DO LEGADO DO SEPULTURA
Lá no fundo, sempre animando a multidão com um alto astral capaz de rivalizar com o de um grupo de pessoas, Gabriela Abud (tendo substituído a búlgara Michaela Naydenova há pouco tempo) demonstra que a idade é um mero número, já que mesmo sendo muito nova, descarrega uma barricada de uma pessoa só ao "marretar" impiedosamente o seu kit com as linhas de bateria compostas pelas suas antecessoras (e com adicionais da própria em certas passagens, como na introdução do encerramento), comprovando que não deixa a desejar em afirmar domínio em seu instrumento.
Inicialmente introduzida como baixista em 2022 com os primeiros shows da NERVOSA após o período da pandemia que assolou os arredores do planeta, a grega Helena Kotina se mantinha em constante movimentação do palco nos intervalos de seus riffs e solos que puxavam a atenção a si devido ao vigor dos próprios, como um pré-requisito essencial, sempre no ponto de limite do palco e a pista central para agitar o local.
Uma face não desconhecida, só que pela 1ª vez em turnê no Brasil foi corporificada pela holandesa Emmelie Herwegh nas tarefas do baixo, que substituiu a grega Hel Pyre pela passagem na América Latina por questões de deveres maternais. Sua presença entra em sinergia com as demais pelo grande sorriso contínuo que não escondia ao estar compartilhando este ocorrido, trazendo a combustão emocional necessária aos presentes na casa.
Com mudanças na formação em rápida sucessão entre os dois últimos lançamentos, um chamativo para aqueles que não puderam acompanhar o SUMMER BREEZE BRASIL 2024 era o fato de presenciar os vocais apresentados pela líder Prika Amaral, quem tomou mais uma responsabilidade em suas mãos ao realizar esta tarefa enquanto performa riffs violentos no front, assim como as ocasionais tarefas de solo, como puderam ser vistas em KILL THE SILENCE e em VENOMOUS.
Adicionalmente, em sinal de respeito, a própria mencionou a ausência de Hel Pyre e voluntariamente explicou que é pelo fato de ter que cuidar da sua filha em casa, como consideração pela membra ausente e praticando empatia por aqueles que colocam a família em primeiro lugar.
E felizmente, a aceitação de Emmelie pela nação headbanger brasileira como um todo foi, na prática, unânime.
- KINDER OVOS VÊM EM FORMATOS DIFERENTES
O repertório teve espaço para canções que já são "figurinhas carimbadas" e que definem o que a banda veio a ser. Um dos propósitos de DEATH! era deixar as pessoas mais tranquilas com as suas mudanças de tempo e para quem já acompanha a NERVOSA há anos. MASKED BETRAYER era esperada para aparecer em alguma hora, por se tornar tradição em suas apresentações, e com uma cantoria fácil de ser gravada.
A ótima PERPETUAL CHAOS (faixa-título do penúltimo álbum) traz um paradoxo: apesar de ter um ritmo menos rápido do que a maioria das que foram tocadas, ela serve como um testamento para quem tinha dúvidas quanto à qualidade com a mudança vocal. Por análise empírica, havia gente que não esperava o quão potente seria a gutural de Prika in loco, que dispensa o uso de qualquer modificação para alterar o seu efeito imponente.
Reza uma das leis da vida de que, por definição, surpresas são inesperadas. Pois bem: a 1ª delas foi a participação de Alex Camargo em UNGRATEFUL, que foi merecidamente recebido por uma recepção calorosa. Afinal, estamos falando de um veterano de um dos maiores expoentes da música extrema nacional: o grande KRISIUN.
Era notável um certo desconforto do próprio: natural, pois ele geralmente performa com um instrumento em mãos, então vê-lo fora da sua zona de conforto foi, no mínimo, curioso. Isso não pareceu ser um problema para aqueles que estavam lá, que extraiam mais energia de seus corpos, os quais pareciam não ter.
URÂNIO EM NÓS possui um fato curioso: foi a escolha de Prika como um teste para ver se ela conseguiria tocar guitarra e realizar os deveres de canto simultaneamente. Num saldo geral, pudemos observar que sim, e a descrição desta, assim como a de outras como HOSTAGES, deu a impressão de que um flashback desde o nascimento até a chegada dos 15 anos estava sendo transmitido, contando o progresso da NERVOSA.
Eventualmente, era a hora da próxima surpresa: CULTURA DO ESTUPRO foi tocada pela 1ª vez ao vivo, contando com as presenças de Yasmin Amaral (ESKRÖTA) e de Mayara Puertas (TORTURE SQUAD) participando nos vocais, fazendo com que Prika tirasse por um tempo a sua guitarra e as acompanhassem com mais liberdade de movimentação. A presença delas não foi sem um propósito, já que as vocalistas usaram aquele instante como protesto de uma realidade que infelizmente assola todo o mundo, usando as suas vozes para demonstrarem indignação com este fenômeno.
Ver as três bangeando circularmente de forma uníssona foi um significado de arte pura.
Se aproximando do fim, o último "kinder ovo" da performance veio na forma de WAYFARER, que assim como a canção antecessora, também fora tocada pela 1ª vez nos palcos. O adendo veio com o fato dela ser cantada com a voz limpa de Prika, o que invocou muitos rostos maravilhados com esta diferença.
Apesar da fundadora ter lançado um teste à plateia ao realizar uma piada autodepreciativa questionando a sua capacidade em fazer isso em específico mais vezes, a onda sonora de entusiasmo recebida como resposta diz que sim, é uma boa ideia tal tentativa ser repetida mais vezes.
Uma apresentação de todas as membras veio na sequência, anunciando a aparição do final, embora o público não tenha demonstrado em nenhum instante que estava com as energias gastas, mesmo após mais de 7 horas de festival.
- LÁGRIMAS DE ALEGRIA NÃO SÃO SINAIS DE FRAQUEZA; SÃO UM TESTEMUNHO DE GRATIDÃO POR ESTAR VIVO
Quando se trata de violência sonora, a canção que iria encerrar esta verdadeira festa carrega esta característica desde a sua concepção. Fazendo uma ode ao gênero ao qual faz parte, e seguindo a tradição desde o lançamento mais recente, o final ficou por conta da majestosa ENDLESS AMBITION.
Sendo a última oportunidade de aproveitar o que provou ser mais do que um show comum, não foi nada incomum presenciar uma aglomeração maior no mosh no meio do Carioca Club e um headbanging mais visceral pelo grau de pancada que a canção detém. Por mais que a raça humana tenha o deleite em se autointitular como "evoluída", ENDLESS AMBITION é um lembrete amigável de que não estamos acima da agressão física (ainda que organizada).
Em oposição a um sussurro, o 1º Dark Dimensions Fest foi terminado com um imenso estouro, deixando a audiência animada o suficiente para um ovacionamento mais forte do que todos os que vieram antes deste, em êxtase por um concerto digno vindo de uma das principais embaixadoras da expressão cultural extrema brasileira que é a NERVOSA.
Ainda que mal pudessem sair do palco, e com um voo para a cidade de Recife num prazo apertado, deve ser mencionada a consideração pela audiência presente (que são os responsáveis pelo plateau que o conjunto se encontra no atual cenário) por parte de todas, mesmo que fosse um atendimento bem breve para parabenizar pela performance, uma foto de recordação ou a assinatura de algum item. Isso se manteve até o momento de fechamento da casa, até que a leva de pessoas fosse dissipada.
Desta forma, o aniversário da maior cidade da América Latina deu um recado de que o Metal Extremo está vivo e bem, e o Dark Dimensions Fest tem o potencial de se consolidar como um dos principais festivais de Metal de reconhecimento nacional, nutrindo o desejo de que o próximo tenha uma entrega de, pelo menos, no mesmo nível do que o da 1ª edição.
Texto: Bruno França
Fotos: Amanda Vasconcelos
Edição/Revisão: Gabriel Arruda
Realização: Dark Dimensions
Mídia Press: JZ Press
Nervosa – setlist:
Seed of Death
Behind The Wall
Death!
Nail The Coffin
Kill The Silence
Perpetual Chaos
Venomous
Ungrateful (com Alex Camargo, do Krisiun)
Masked Betrayer
Under Ruins
Hostages
Urânio Em Nós
Kill Or Die
Cultura do Estupro (com Yasmin Amaral e Mayara Puertas, da Eskröta e do Torture Squad, respectivamente)
Into Moshpit
Jailbreak
Wayfarer
Guided By Evil
Endless Ambition