domingo, 26 de janeiro de 2014

Entrevista: Projeto "Tá no Sangue! A História do Rock Pesado Gaúcho"



Desde 2009, o grupo que está compilando, garimpando informações e material de forma a contar e reconstituir a trajetória do Rock Pesado Gaúcho (onde poderemos conferir o início de bandas como Krisiun, Panic, Defalla e tantas outras, além de verdadeiras pérolas a serem descobertas), formado a partir da iniciativa de Luís Augusto Aguiar, vem trabalhando arduamente, com a ajuda de vários amigos, colaboradores e simpatizantes, a fim de, em breve, ter realizado plenamente o projeto, que já foi batizado inclusive, recebendo o nome de "Tá no Sangue! A História do Rock Pesado Gaúcho", que além do lançamento do livro, prevê um festival e outras ideias.

Panic
A exemplo também de documentários como "50 Anos do Rock Brasileiro" e "Heavy Metal Brasil", que vêm sendo produzidos há algum tempo, o "Tá no Sangue!" também se somará a esses projetos que serão de grande valor à nação rocker em geral, e com certeza será um belo material, não somente para o público do sul do país, tanto para quem viveu a época, como para novas gerações, sejam de músicos, fãs, simpatizantes, e até mesmo pessoas não tão ligadas a música pesada, pois o trabalho trará um retrato e histórias de uma época que ainda não tínhamos o acesso à informação tão facilitado, uma época de luta, histórias engraçadas, algumas até um pouco tristes, saudosismo, conquistas...

Confira abaixo o papo com o Luís Aguiar, e saiba mais a respeito deste maravilhoso projeto!

Maicon (C/Camiseta do Krisiun) e Luís: Entrevista com Roberto (ao centro), do Astaroth

RtM: Como surgiu a ideia do projeto e há quanto tempo você vem trabalhando nele?

Luis: O início foi na metade de 2009. Da minha parte, surgiu após eu ter lido alguns livros e matérias que falavam sobre a história do rock gaúcho e nacional, e nestas publicações pouco era mencionado o rock pesado* gaúcho, que possui uma história riquíssima, com muitas pessoas que dedicaram, e muitas que ainda dedicam boa parte da sua vida em prol deste estilo de música, e que acabaram adotando como estilo de vida inclusive.

Neste mesmo ano(2009) ao procurar parceiros para desenvolver o Projeto, achei através da internet o Maicon Leite, que também tinha a ideia de escrever um livro sobre o mesmo assunto. A Cida Goulart e o jornalista Douglas Torraca foram convidados a entrar no Projeto algum tempo depois.

*Usamos o termo rock pesado pois não queremos abordar somente o Heavy Metal e as suas subdivisões, mas também Hard Rock, Rock Progressivo e Punk/Hardcore.
 
Coletânea histórica, lançada em 1984
RtM: Como vocês organizaram a busca pelas informações e material para compor o livro? E que tipo de material vocês buscaram além das entrevistas?

Luis: Em um primeiro momento começamos a fazer contato com muitas pessoas ligadas à cena, para identificarmos quem seriam as pessoas “chave” que poderiam contribuir conosco, aquelas que fizeram as coisas acontecer na cena. Automaticamente algumas pessoas, por indicação, nos levaram a fazermos contato com outras mais. 

As redes sociais da internet foram e estão sendo fundamentais neste processo. Após esta primeira etapa de descobrirmos quem seriam estas pessoas para entrevistarmos, iniciamos o processo de pesquisa de material em livros, revistas especializadas e na internet, que nos levou a fazermos contato com mais gente ainda, formando uma grande rede de contatos e divulgadores de informações.

Leviaethan
RtM: Vocês buscaram também informações e material no interior do Estado? Provavelmente também devem ter descoberto muitas pérolas perdidas no tempo.

Luis: Nós sabemos da importância que o interior do estado tem na cena de Rock Pesado Gaúcho, com bandas e eventos realmente importantíssimos, principalmente no que tange ao underground. Há rockers abnegados espalhados por todo o estado, e não só nas grandes cidades. Graças à internet conseguimos chegar até várias pessoas do interior do estado e que muito tem colaborado conosco. Gostaríamos de ter viajado mais para podermos entrar em contato direto com estas e mais pessoas, mas mesmo assim pessoas que moram em 21 cidades gaúchas foram entrevistadas ou responderam o nosso questionário, além de pessoas que hoje moram em outros estados e países.  Muitas “pérolas” que muitos nem imaginam que tenha acontecido no interior do estado...
 
Demo-tapes eram o meio de divulgação das novas bandas, são itens guardados como tesouros hoje

RtM: E a montagem e organização do material compilado, como será montado o livro? Falem um pouco sobre esse processo.

Luis: Pretendemos contar a história da forma mais cronológica possível, dos primórdios lá no final dos anos 60 até os dias atuais, com muitas fotos, cartazes de shows, flyers, etc.  Em breve iniciaremos o processo de coleta deste material, e gostaríamos de aproveitar este espaço para  solicitar aos leitores do Road do Metal que queiram contribuir com material, que façam contato conosco através do e-mail projetolivrors@gmail.com ou através do nosso Grupo e Página no Facebook. Sabemos que há muitos “baús com relíquias” a serem abertos.

RtM: Vocês chegaram a fazer quantas entrevistas?

Luis: As entrevistas estão encerradas. Entre entrevistas presenciais, através do Skype, do “falecido” MSN e por e-mail foram 136 entrevistas com a participação de 172 pessoas, entre elas músicos, fãs, radialistas, jornalistas, empresários que possuem lojas de artigos ligados ao rock e produtores de eventos.

Ivan, do Astaroh: A banda foi a responsável pelo primeiro LP de Heavy Metal no RS
RtM: Durante esse período de pesquisa vocês tiveram alguma resistência, alguém se negou a participar ou dar entrevista?

Luis: Infelizmente, tivemos sim. E para alguns tivemos que ter uma persistência um pouco maior até convencermos estas pessoas da importância da participação delas em algo que envolve não só a sua história particular, mas algo muito maior. Mas respeitamos a decisão de quem não quis colaborar.

RtM: Dentre todo esse processo, devem ter ocorrido fatos inusitados, e até surpreendentes, você poderiam contar alguma, ou algumas passagens, desse período de verdadeiro garimpo?

Luis: Os fatos mais inusitados ocorreram durante as entrevistas presenciais em bares e outros locais públicos. Teve entrevista que rolou até pagode no ambiente, com uns tiozinhos que já chegaram bebuns no bar e transformaram aquela música numa sessão de tortura aos nossos ouvidos. Essa entrevista da metade em diante ficou prejudicada, mas conseguimos terminá-la.  

Teve outra entrevista que rolou em outro bar que à medida que a entrevista ia transcorrendo a música ambiente ia aumentando de volume e na mesma proporção as pessoas em volta falavam mais alto. Em suma, alguns músicos da banda entrevistada saíram roucos e integrantes da nossa equipe não ouviram praticamente nada do que foi dito.

Além das demos, os releases, cartazes, zines e flyers eram formas de divulgação, distribuídas de mãos e mão, correios, nos shows...
RtM: E em que fase está o livro? Vocês já possuem uma previsão para lançamento e o que vocês programam para isso? Lembro que existia a ideia de um show, reunindo algumas dessas bandas e músicos que fizeram e fazem parte dessa história do som pesado Gaúcho.

Luis: Estamos concluindo as transcrições das entrevistas. O “esqueleto” dos capítulos do livro já estão praticamente prontos, selecionaremos as informações mais relevantes das entrevistas para encaixarmos nos capítulos. 

Inicialmente pretendíamos lançar somente o livro, mas com o passar do tempo essa ideia se transformou em um Projeto, que envolve além do livro um festival com 12 bandas significativas da cena de Rock Pesado Gaúcho. O Projeto foi inscrito no Ministério da Cultura (MINC), e em 2013 obtemos a aprovação pelo MINC nos autorizando a captar recursos através da Lei Rouanet.

Eduardo e Carlos Garcia, do Road, reunidos com parte dos colaboradores do projeto
RtM: Também pude contribuir com algumas transcrições de entrevistas, e posso dizer que é um material incrível, realmente documentos e depoimentos históricos, onde aprendi e descobri muita coisa da história do Rock aqui do sul. Vocês pensam em uma maneira de disponibilizar essas entrevistas na íntegra futuramente?

Luis: Possuímos um vasto material em forma de entrevistas e depoimentos, infelizmente nem tudo conseguirá entrar no livro. Acreditamos que este Projeto renderá muitos outros frutos no futuro, e gostaríamos muito que isto seja apenas um começo para algo muito maior e que engrandecerá a cena do Rock Pesado Gaúcho.  

RtM: Outra coisa que achei muito interessante, foi quanto aos depoimentos dos entrevistados falando sobre os shows históricos, seja de bandas nacionais ou internacionais, que aconteceram aqui no RS, shows como o do Inox, ou do Quiet Riot em 85, quer dizer, coisas que, devido à dificuldade que era de obter a informação na época, a gente nem ficava sabendo que ia acontecer. Hoje, com a internet, fica muito mais fácil.

Luis: Nos tempos pré internet realmente as informações dependiam de chamadas em rádios ou publicações no jornal, e muita coisa mais underground rolava na base da divulgação via cartazes colados pelos próprios músicos nos muros das cidades, entrega de flyers mão a mão, ou na base da divulgação do boca a boca mesmo.  

Demo-tape da Megalon, de Taquara-RS

Hoje em dia, com poucos cliques, se tem acesso a informações de eventos que ocorrerão meses depois.  Só para exemplificar algo específico de uma época... quantas pessoas teriam ido ao show do Viper em Porto Alegre, quando estiveram aqui pela primeira vez (anos 90), se soubessem que o André Matos já não estava mais na banda? Muitos ficaram sabendo no momento que a banda entrou no placo. Se ocorresse hoje em dia, com a internet, com certeza esta informação já estaria sendo divulgada com antecedência.

RtM: Também chama a atenção a bagagem de muitos dos músicos e pessoas que fizeram parte dessa história, muitos moraram ou moram ainda no exterior, traziam ou recebiam material e informação de lá, desde LPs até equipamentos, enriquecendo a cena, lembrando que naquela época a informação não andava tão rápido como nos dias de hoje.

Luis: Lá nos longínquos anos 60/70 e até no começo dos 80, a forma de se ter acesso a material importado (discos e equipamentos principalmente) na grande maioria das vezes passavam por ter algum amigo que trouxesse este material do exterior, ou ser amigo de um comissário de bordo ou piloto de alguma empresa aérea da época, visto que muito material não saía em versão nacional, principalmente os discos de rock pesado, revistas e informações chagavam aqui já com notícias defasadas.  Instrumentos musicais importados então eram motivo de veneração por outros músicos e pelos fãs. Uma época mágica, porém de muitas dificuldades, batalha e conquistas. 



RtM: E o apoio e financiamento para lançamento do material?

Luis: Com o Projeto aprovado pelo MINC, estamos agora na batalha por patrocinadores, para que possamos viabilizar o livro sendo distribuído, sem custo para os leitores, e para que aconteça o festival, a ser realizado em um amplo lugar público, sem a cobrança de ingresso, tornando um fato atrativo aos patrocinadores que poderão expor a sua marca para milhares de expectadores no festival, além do site exclusivo do Projeto, e também nas redes sociais. Caso o presente leitor queira ou conheça alguém que possa ou queira patrocinar o Projeto, entre em contato conosco.

Luís, em mais uma entrevista
RtM: Finalizando, deixo o espaço para a sua mensagem final, e os parabéns pela grande iniciativa, que com certeza enriqueceu os seus conhecimentos e vai enriquecer o de muitos leitores assim que o livro for lançado. Com certeza será um documento histórico.

Luis: Gostaríamos de agradecer a todos que tem nos ajudado durante este tempo, quer seja com as entrevistas, fazendo transcrições, nos passando informações, postando material nas redes sociais, nos incentivando e além da Road To Metal pela oportunidade de estarmos divulgando o nosso Projeto.

A história que estamos querendo contar é de pessoas como nós, que de alguma forma se doaram em prol de algo que realmente gostam. Vários que  transformaram um hobby em profissão, que acreditaram e acreditam que o Rock Pesado agregou e agrega algo muito importante em suas vidas e na vida de quem também gosta deste tipo de som, e isto  torna de alguma maneira a vida destas pessoas melhor. E, se de alguma forma pudermos encher de orgulho estas pessoas por tudo o que fizeram, seja qual o tamanho da sua contribuição, e principalmente mostrar à nova geração a responsabilidade que eles têm em manter e dar continuidade a isto tudo, incentivando a cena e produzindo material de qualidade, poderemos dizer que teremos cumprido o nosso objetivo.
United Forces!!!

Luis Augusto Aguiar.


Entrevista/edição: Carlos Garcia
Fotos: Arquivo Projeto (fotos enviadas pelas bandas, fãs e colaboradores)

Contato: projetolivrors@gmail.com


















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